a três vírgulas do chão e de clarabóia a entrever a lua zumbir em torno da terra. um quarto a ver-se do regato por debaixo das saias dos amieiros. plantado numa herdade onde os pés de blusa nascem senhoras, dos pentes tomates, dos caroços de azeitona saladas temperadas.
- encontrarás o teu caminho, ao primeiro raio de sol sobre o meu calcanhar o mais belo pé que levarás à boca! – sou a fonte palpitante no seio das primaveras ao romper da aurora. não sei o que têm as flores que ladram em fila de fome com a malga de espera a colher pássaros. diz que os pássaros pintados são os donos das violas, que as navalhas compraram as coroas de laranjeira, as cordilheiras venderam as minas de café aos meninos de vento. meu amor, os dedos precisam da saliva para pintarem o que beijam. desde lisboa que tenho as 5 fechaduras que dão para dentro do planeta. minha asa com a tua asa fazem repicar o meio-dia-fatia sobre a mesinha-de-verga. Já se vê o exército de formigas a atravessar os dentes do elefante poente. picotado por um relâmpago o sorriso do cavalo parou a dança das cadeiras. fazemos postais com sentenças de alfinete. os teus desejos tornar-se-ão palpáveis como o gelo que assiste ao despejar dos bolsos ao vinho no teu cálice.
degraus de vento
preciso desesperadamente de ir aos lugares
para decifrar as minhas águas
é nelas que vejo a imagem e o significado
os passos são o vento que abre a visiva
o nosso olhar – essa dança parada
alpina a memória sobe ao símbolo como fervura levantada
todavia o que lembramos é indício de caminho ainda por chegar
um simples cântico pode acelerar mais uma obra que mil motores
entre os bancos da basílica passam caudais de silêncio
onde afluem pequenos regatos ajoelhados perante o que constroem
tecem arapucas a fio de medo entre as sombras
é brilhante a dolorosa seda das preces afinadas
altares com o resumo à escala vulgata da separação
metem a mão no bolso dos mistérios guiados
bate catabático o vento no peito trancado
abrem asas nas máscaras da fé imaginada
o desejo e o perdão entrelaçam-se noutra atmosfera
uma monja da ordem fechada no altar gradeado
é o vértice da leveza submissa reclusa em pedernal
lentamente fujo para respirar o abismo a céu aberto
sentir-me cair lágrima abaixo ampliada
reter a imagem de tudo e escorregar na incerteza da escada
porvindoura uma percussão chama-nos no poente ultrapassado
a mesma antecede a pele do animal tocado
numa paisagem sem chão só o silêncio arrulha
a voz sai como eco tatuado
os braços caem para dentro de outros nascentes
e as mãos em rizoma da perifala
bordam as linhas em si desenhadas
porvindoura uma dança acontece
dentro da luz que nos é lançada
tu apareces em vários tons de negro parado na estação
os teu olhos entram na minha voz quando falo
pois falar é abrir um deserto a um público sempre escasso
e só lhes nascem aos mãos quando nos querem matar
ou cobrir de flores
é de negro que estás na minha tábua flutuante
para que te distinga sobre a neve que encobre a visão do gesto
deste espartilho de pedra plantada,
com um amor que anestesia as pregas da ausência
fátima vale, no caminho do meio da tábua flutuante
dois meses depois continua a ser um de julho.
FV – Portugal, Aug 13, 2019