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Autoridade é quem conseguiu fazer o maior conchavo! (GT- 1994)

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Trecho de um documentário feito pela TV Cultura em 1994 “Gerald Thomas – Ser ou não ser”

GT- Autoridade é quem conseguiu fazer o maior conchavo, é quem conseguiu pagar o maior dinheiro para estar ali. Eu não tenho nenhum respeito por autoridade. Nenhum. Autoridade são aquelas pessoas que fizeram todas as concessões, que fizeram as maiores porcarias do mundo, as maiores nojeiras do mundo para poderem ocupar esses cargos. Eu posso respeitar uma pessoa dessas? Eu, dentro da Anistia Internacional, vi os piores conchavos do mundo entre liberais e Augusto Pinochet e o General Videla, da Argentina, por exemplo. Você quer que eu tenha algum respeito por esses imbecis? Quando você aceita normas, você, de uma certa maneira, está se nivelando pelo o que há de pior, pelo mínimo denominador comum. E, quando você é uma pessoa que não está encaixada nessas normas e reconhece essas normas em outras pessoas na sociedade, na arquitetura, na maneira de se ler jornal, na maneira de se construir jornal, na maneira de fazer teatro, em todos os aspectos, isso dá ódio, dá revolta, dá vontade de dizer coisas.

Gerald Thomas

 (1994)

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Fiquem com um texto meu, sobre uma pedra, a pedra, do Muro de Berlin até a pedra de Ground Zero, até todas as pedras….

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“Pedra de Toque”

By Gerald Thomas © New York – London 2009

Quando eu atravessava a ponte de Williamsburg, na madrugada de 11 para 12 de setembro de 2001, em direção ao Ground Zero para ver se conseguia chegar ao monte de ruínas daquelas duas torres  que eu vi crescendo, lentamente, andar por andar, e depois ruindo, numa só explosão, numa só exploBUM, no  chão aquele monte de ferro retorcido, aquelas duas torres com cara de nada, a cara da geração de Warhol, retorcida e derretida no chão,  o impacto bateu no meu fígado, pessoas passavam desnorteadas em todas as direções. Meus olhos procuravam se fixar nos rostos menos retorcidos que eu podia achar, assim como numa certa manhã, atravessando a Ataulfo de Paiva, segurando a mão da minha mãe bem forte porque havia um morto coberto por aquele horrendo lençol branco e cercado de quatro velas acesas: eram as cenas normais da vida carioca às quais ainda não estávamos acostumados. Meus olhos então veem um passarinho morto no chão, isso na Ataulfo de Paiva, em plena década de 60 no Rio. Um passarinho irmão, morto e empoeirado e seco hoje, nessa tentativa de atravessar essa ponte para ir até o Ground Zero.

Toda aquela poeira me cobria e parecia a poeira de todo o século XX, a poeira deixada de tudo aquilo em que eu acreditava no século que acabava de ser fechado, assim como eu fechava as cortinas depois de espetáculos empoeirados e com igual quantidade de fumaça! Minha cabeça naquele dia estava suicida.

Eu, meio quase nada, estava atravessando aquela ponte, atravessando em braile,  em direção a um  monte de ruínas pegando fogo. E eu caminhava naquela direção para conferir o quê? As pedras no chão? Ainda voltando no tempo e segurando na mão da minha mãe, me pego do lado de fora de uma doceria e descubro algo que me assusta terrivelmente: vejo uma mendiga enorme, velha, com um de seus seios à mostra e um filho no colo.  Me sinto estrangulado, sufocado eroticamente seduzido. Talvez a minha primeira percepção de erotismo ou de amor até.  Eu vivia numa espécie de solilóquio interno, nunca falado da boca para fora, sempre interno e que, eu achava, me colocava em contato com as estrelas, com o universo. Eu estava apaixonado por aquela mendiga, trocaria tudo para estar com ela, no colo dela, mas minha mãe, provavelmente notando isso, puxou a minha mão ainda mais forte e saímos dali com mais pressa.

Já faz não sei quantas horas que o World Trade Center caiu. Quando criança eu abria a porta do armário e brincava com as ruínas ou detritos do Lego e me encurralava para dentro da cama ou para dentro daquele imenso armário barroco que virou o meu “teatro”, a minha “arena de ações fictícias”, onde bonecos e cabides, velas e volumes quaisquer faziam uma verdadeira mise-en-scène. O barulho das torres caindo, assim como o das crianças na rua jogando bola, era ensurdecedor, e eu queria estar onde os mendigos estavam, onde as ruínas estavam, onde os “rejeitados” estavam, porque sentia que não teria pique para aguentar essa farsa: já lá logo cedo dei a isso um nome: love.

Era tanta coisa!  O que eu havia visto naquele dia, digo, o desmoronamento que eu havia presenciado naquele dia culminou numa espécie de êxtase, aquele que leva as pessoas a um clímax coletivo. Me aproximando lentamente, muito lentamente das ruínas do Ground Zero, aquela confusão toda, gente por tudo que é lado, minha reação foi estranha. Virei para trás. Quis dar meia volta e retornar, mas paralisei. Se alguém estivesse vendo as minhas pupilas dilatadas talvez estivesse vendo a Guernica revivida, as vacas da tela de Picasso apagando aquela lâmpada, ou então a “Europa depois da chuva”, de Max Ernst, mais destruída ainda, sei lá, não sei o que descrevo.  É avassalador como algumas obras de arte têm o poder de invadir nossas cabeças nesses momentos de tragédia.  Ruínas dessa proporção parecem que têm esse poder. Será que a destruição do poder também terá esse poder? Me aproximei. Assim como uma criança ou um ser apaixonado ou apavorado, acabo de ter aquele ataque de lucidez absoluta, uma lucidez a meu respeito. Digo, me percebi “perecível”. Minhas feições, troncos, membros e – até então – uma curta existência eram todos uma ruína em plena paranoia. Quando criança era porque minha mãe me arrancava da mendiga minha paixão. Hoje porque…

Cheguei lá nas ruínas, nas tais ruínas que Beckett tanto descreve em sua prosa e em sua dramaturgia were the ruins still there where you played as a child, when was that?”, da peça That Time (Aquela Vez) na qual dirigi Julian Beck também aqui em Nova York há 23 anos. Julian, nas ultimas, era uma “ruína” em si.

Quimioterapia e câncer no corpo inteiro, seria a primeira vez em que Beck pisaria fora do seu “Living Theater” e me convidou para dirigi-lo. Isso é, até hoje, um ponto de interrogação na minha vida.  Logo eu? Juntei Beck com Beckett e comecei esse louco processo metalinguístico que conta uma verdade dentro de outra e cria mais de uma camada de leituras: o ator estava doente e o público, seu imenso público, sabia disso. A peca só mostrava a cabeça de uma pessoa imóvel ouvindo vozes de três fases diferentes da vida do seu próprio passado. A combustão era estarrecedora. “Se a ruína ainda estava lá, onde você brincava em menino, onde foi aquilo?”. O público ouvia isso e achava que seria a última vez. E foi. Logo depois da nossa apresentação aqui no La MaMa, fomos para Frankfurt e Julian morreu durante a temporada, digo, na volta de Frankfurt.

Nas ruínas em chamas do WTC, bombeiros, polícia e todo tipo de isolamento possível, mas, de alguma forma, entrei. Sentei e chorei pelo dia intenso de perplexidades. Se soubesse então o que sei agora, o que teria feito? Mas o que sei agora? Iraque? Conspirações? Politicagens?

Quando levei meu pai de volta para Berlim o “Muro” ainda não tinha caído. Meu pai não tinha voltado para sua Berlin desde a guerra. O que se via do lado de cá, do “nosso” lado ocidental, olhando para a Berlim Oriental (de binóculos), eram ruínas, arame farpado e guaritas com soldados e alguns coelhos andando entre os dois muros. O Muro eram dois, com minas, caso alguém conseguisse pular. Cento e cinquenta mil tentaram. Baleados, calados, furados, peneirados, eles podem contar uma história tão sórdida quanto o resto das divisões geopolíticas das tantas Europas, com suas emboscadas étnicas que terminam assim, com um tratado entre tratantes. Antes da Primeira Guerra ou pós-Segunda Guerra, ou entre uma e outra, as fronteiras inimagináveis agora eram mais que imagináveis e até amigáveis. Mas entre a imaginação e a assimilação, morrem milhares de seres humanos. Ah sim, e cavalos. Meu pai, plantado em cima daquelas plataformas de madeira, seja numa das extremidades de Berlim Ocidental ou noutra, calado, sempre calado, não conseguia reconhecer sua cidade. Ou melhor, entendia e sofria tanto, tanto que nada dizia. Uma sensação bem parecida com a criatura beckettiana que o Julian interpretou três anos mais tarde em That Time, nada dizendo, somente apavorado com “se as ruínas ainda estavam lá onde eu brincava…

Meu pai não sobreviveu para ver a queda do Muro. Morreu acreditando para sempre em sua Berlin dividida, cortada ao meio cirurgicamente, ou ilhada, seja como queira ser visto o Muro pichado, sua Berlim dividida entre  aliados e russos. Morreu no meio da temporada, entreatos.

Uma historinha engraçada: meu tio, o Joachin, que era uma espécie de ministro da “sanitarização” na Alemanha Ocidental (mas cujo trabalho foi fundamental na limpeza do rio Tâmisa, onde hoje nadam trutas e salmões – digo em parte dele), enfim, esse tio, tia Marly e meus primos fomos comemorar o aniversário da minha avó “maldosa”, a Paula: fomos no restaurante do Hotel Kempinski, no Kurfürstendamm, avenidona principal de Berlim. Chiquérrimo, na época. Depois de lagostas e outras “ostras”, tudo flambado e adequadamente banhado em cremes enjoativos, como as comidas da época pediam,  ele “ordenou” a sobremesa mais cara do lugar: nós, as crianças (odiando tudo, pois estávamos “engravatados”), não contivemos o riso, a gargalhada, pois os pretensiosos garçons tchecos vieram, numa minuciosa coreografia, destampar os doze pratos enormes e, dentro deles, uma banana. Sim, em cada prato uma banana meio descascada, como naquele cartoon clássico: a casca da banana meio retorcida para trás como se fosse uma preciosidade de plástico, digo, de ouro! Essa era a sobremesa mais cara de onde eu brincava em menino? Não, eu vinha do Rio e meus primos, de Caracas. Morremos de rir. Banana de dar e crescer!

Ground Zero. O fogo altíssimo, muita fumaça e muita poeira e muita gente, e eu não sabia muito bem como sair de lá, agora que estava plantado lá, já que atravessei todas as barreiras para chegar lá, mas sabia que tinha que ser, tinha que estar lá, ver aquilo tudo, depois de ver a catástrofe da minha janela em Brooklyn.

Peguei uma pedra no chão. Não sei se era, de fato, um pedaço do World Trade Center, mas quero acreditar que sim. E com ela sentei numa pilha de poeira, ou melhor, de ruínas, e chorei o resto da madrugada. Até que a polícia me deu um macacão amarelo de trabalhador e me disse GET TO WORK” e me puseram para trabalhar.

Nesse momento, acho que entrei em delírio: como assim, “get to work”? Não consigo sair desse paradoxo circular, ou seja, esse som de bomba que foram os aviões batendo, ou as guitarras de Hendrix tremendo no Fillmore East, aqui perto, há trinta e oito anos, e esse barulho de novo nos meus ouvidos como se fosse uma ordem ao contrário, com eco e tudo: “Eu não aguento mais” e – como se plagiando Lapoujade, sinto tudo aquilo contra o qual devo me defender – “GET TO WORK”! Como assim???  Me defender das torres caindo e da pedra na minha mão, daquilo que meu corpo sofre e me faz sofrer, dos outros caminhando em vão na minha frente empoeirados e fedendo a morte? Fui, de fato. Fui trabalhar lá, onde as ruínas estavam. Mas não fui brincar.

Me sinto o último dos últimos, e sem a menor identidade e, nesse momento quero mandar todos à merda num único e último banquete: desde Nietzsche a Deleuze. E aqueles a quem Nietzsche chama de homens superiores…  Superiores é a merda. Vem para cá, Herr Nietzsche. Vem ler essa frase aqui: “Não aguento mais.” Que tal? Em qual Trieste triste estás agora, Sr. Nietzsche, ou será que ainda estás sentado debaixo do piano de Wagner, encantado pela overture de Tannhäuser? Nada disso. O cavalo que o senhor viu sendo espancado eu vejo todos os dias nos rostos de todas as pessoas. E as catástrofes? Eu as vejo todos os momentos. E em todos os lugares. Sim, seus planetas são ótimos, seus Zeuses, Deuses, “Dioneuses”, “Zaragogos” e “Demitustras” são ótimos, e assim são os seus superlativos, mas “não aguento mais”. Essa foi a sua melhor frase, com ou sem sífilis. Essa é a minha melhor frase com essa pequena pedra que seguro ainda quente em minha mão.

Me lembro um dia, acho que era em Zagreb, durante um festival de teatro, que parei de me emocionar. Ouvi histórias de croatas e de servo-croatas baleados e feridos pelos recentes conflitos (melhor chamá-los de atrocidades), e me concentrei num garoto que contava que acabara de voltar de Dubrovnik, e aprendi a apreciar a simplicidade e a beleza com que as pessoas se despiam e caíam no mar, sabendo que estavam sendo vistas. Apesar de notar que uma gota de lágrima ou algo salgado entrava na minha boca, esse tipo de beleza sensual, sexual, esse tesão que as guerras provocam da mesma forma que um pulo n’água de um corpo lindo e nu.

Não tive escolha no Tennessee quando subi no ônibus de adolescentes negros porque quis, porque achava a segregação um absurdo, porque falei “fuck you, white trash!”, e fui vaiado pela primeira vez na minha vida! E com que orgulho. Aprendi cedo. Aprendi cedo a lidar com a autoestima quebrada: Ivan Serpa, meu mestre, rasgava meus desenhos ao meio na frente de todos. Todos viam e todos ouviam a seguinte frase: “Não se persegue uma obra de arte! Ouviu, garoto?”, e vai-se mais um rombo no desenho que tinha levado mais de uma semana para fazer para impressionar o Ivan, a turma de mais velhos, o Helio Oiticica e outros gênios que lá estavam no fundo de um lugar horrível em Copacabana, numa daquelas salas que dão para um vão central onde se jogava lixo… uma daquelas “galerias” antes do conceito “shopping” invadir o Brasil, e essas galerias eram o conteúdo de uma pequena vila, seus sapateiros, eletricistas, tapeceiros, costureiras etc. Ivan implantou em mim Marcel Duchamp, todos os modernistas, como se fosse a tortura chinesa, cada semana um pingo, um pingo pesado, e mais o resto da cultura toda. Não, não é de todo verdade. O Ziraldo me deu muito. Muito e muito mais. Ziraldo me abriu os olhos. Eu era uma criança e não tive tempo de brincar de… onde era aquilo?

Mas suspeito agora que oportunizaram a oportunidade: o World Trade Center – além da porrada dos aviões dos islâmicos radicais – pode ter sido dinamitado, suas vigas de ferro fortíssimas serradas em diagonal cautelosamente: é o que os demolidores profissionais chamam de “molten metal”. Eu vi essas vigas diagonalmente cortadas apontadas para cima, sobrando, enquanto multidões tentavam salvar outras tantas multidões, como em The Lost Ones, de Beckett. Não, não pode ser. Pare de delirar, Gerald. Pare de tentar ser um Nietzsche. Você leu demais. Você devorou muitos livros e, portanto, não sabe, como nunca soube, lidar com a realidade. Tudo para você parece sempre um conto, uma ficção, mas isso aqui é o Ground Zero, e não um conto de Kafka.

Quando olho para baixo, para as calçadas do mundo por onde ando, percebo suas falhas e projeto mapas, fronteiras e desenho nelas, nas falhas, países imaginários. Pequenas pedras surgem dessas falhas nas calçadas.  E com esses países, ou falhas, seus hinos.  Esses hinos, obviamente, não são originais, e sim algo como a Segunda Sinfonia de Mahler, a Ressurreição,  misturada a uns arranhões de Zeppelin, Hendrix ou dos Rolling Stones, as “Pedras Rolando”,  e uns murmúrios de letras de livros. Livros esses que abri e abro de vez em quando só para me certificar que eles existem mesmo. O que mais abro é Finnegans Wake, de Joyce, que é uma enorme viagem em si, especialmente quando a gente se pega em plena Zurique – lugar onde sempre estou e não sei por que (me faço essa pergunta e não sei respondê-la: a melhor resposta é talvez dizer que só estou lá por um dia encontrando o diretor artístico da ópera, mas já-já estou subindo para os Alpes, para Wengen, lá para o Eiger ou para o Jungfrau.)  O que eu quero dizer é que, de repente, se está na frente de uma plaquinha em que se lê: “aqui morou James Joyce”, assim como em Londres, em Primrose Hill, na Prince Albert Road, se não me engano, lá embaixo, esbarra-se com uma placa, “aqui morou Engels”. Essas sensações são incríveis, indescritíveis. Diferentes de estar sentado diante de Beckett. Ele era descritível. Bastante até. Mas estar sentado num monte de ruínas, com aqueles holofotes em Ground Zero era bastante indescritível. Até hoje, seis anos depois, procuro achar um termo para isso, mas não o encontro.

Hoje escrevo as minhas próprias peças e olho pra esse East River, de onde não consigo sair há décadas, seja de um lado ou de outro, de Brooklyn ou de Manhattan, e que não parece mudar, o que parece um paradoxo ou um enigma, porque rios sempre mudam (riverrun), na literatura portuguesa e irlandesa, como se fossem cavalos líquidos, uma equitação vertiginosa, uma sensação de tempo passando, física e podre, e um tanto quanto linda. Digo, assim deveriam ser os rios. Mas essa porra desse East River não muda em nada.  Às vezes olho por horas e nada. Nada nada nele. Nem um corpo boiando desde que Spalding Grey se suicidou nele em 2004.  Às vezes passa a barca do lixo que leva os nossos detritos e detratores (ai quem dera, Próspero!) para Staten Island. Mais ruínas.

Sabe, existe sim um momento onde tudo isso, todas essas andanças, todas essas comilanças, todas essas angústias e paranoias, levam a algo. O que é? Estranho. Não sei dizer ao certo. Mas é como se eu caísse em mim por alguns segundos. Por alguns segundos apenas. De novo, a tal lucidez. Por esses segundos tudo para. Eu tento, desesperadamente, segurar esse momento, como se ele fosse desaparecer. Parece que recebi meu primeiro sopro de vida. Quando? Não sei. Em algum ponto, ou em vários (porque foram vários em que senti a mesma coisa), um sopro de vida parecido com o que deve ter sido o berro primal ou o parto em si: não há como não dar um nome específico a isso: isso se chama drama.

Chega disso.

Maior enigma ainda é quando a cabeça está viajando a mil por hora dentro de um avião que está a não sei quantos quilômetros por hora. Rotas, mapas, computador e papéis espalhados por tudo que é lugar, atrapalhando até o vizinho oriental (I’m sorry, Sir, for disturbing you, but this is a play I’m writing and I have a deadline, so… papers and computers all out of order, all in a mess! Invading your space). Silêncio sepulcral nos olhos dele, assim como no meu pai vendo sua Berlim coalhada, assim como o silêncio nas mãos de Julian tocando nas minhas enquanto eu ia buscá-lo para os ensaios: ele na West End Avenue com 98, e o La MaMa cá embaixo na rua 4 entre Segunda Avenida e Bowery. Ou o silêncio quando Beckett resolvia abaixar a cabeça por um tempo (tempo enorme – horas, dias), alguns segundos apenas, e seu olhar um olhar vazio por alguns instantes. Suficientea para me deixar morto de medo daquele sobre quem eu sabia tudo, tudo e mais um pouco desde Imagination Dead Imagine até Malone Dies, até Stillness Still e mais aquilo que ele não queria que se soubesse sobre ele:

Me diga, Mr. Thomas, o F ainda está comendo a H lá no East Village?” Sempre querendo saber quem estava comendo quem, eu procurava não dedurar, mas acabava dedurando, óbvio – quem não resiste a uma fofoca sexual com Samuel Beckett? – para o pavor daqueles como Tom Bishop e outros pretensiosos que queriam preservar – a qualquer custo – a imagem “séria e sisuda” de um velho e rancoroso irlandês no autoexílio. E com aquelas mil e três lindas linhas na testa!

Para quê?

Um autor que só fala em ruínas, mas com muito humor. Humor e “ disjecta” como ele mesmo chama, “pieces for nothing”, nunca esquecendo que aquela mão que eu toquei escreveu, sim, ela mesmo, aquela mão, de fato, escreveu de punho próprio o Finnegans Wake. Joyce ditou para ele, Beckett que anotava. Com muito humor. “He was a painter and an engraver. Where does that come from, Mr. Thomas?” Sem hesitar eu respondia: “Endgame, Mr. Beckett!

Finnegans

O acordar e funeral final, a barbatana, aquilo que sobra para cima, os restos que ainda “stick up” das ruínas… essa é a onomatopeia de Finnegans Wake, mas também é o que eu sentia sentado no Ground Zero ou olhando o outro lado de Berlim, ou pensava em Sri Lanka ou em New Orleans engolida por um tsunami ou pelo Katrina. “Cadê o Arthur C. Clarke? Alguém já foi procurar por ele?”, essa era a minha preocupação egoísta, ligando para o programa do Anderson Cooper, da CNN, tentando fazer chegar a ele a mensagem de que lá em Sri Lanka morava um grande e importante autor.

Chega disso!

“Como assim, chega disso?”, uma voz distante, de um passado distante me pergunta. Uma voz vinda de Auschwitz, uma voz vinda de uma foto de um familiar exterminado lá: olho no olho no meu próprio passado, digo, no olho da foto do meu próprio antepassado   e nada sinto. “Que judeu de merda tu és, Sr. Gerald! Estás aqui no Pavilhão 17, olhando essa pilha de sapatos e cabelos e óculos e os catálogos, e consegues identificar teus parentes e nada sentes?” Ruínas. Um monte de ruínas organizadas em cubículos de vidro e madeira com plaquinhas. Para que? Para que a História não se repita? Não me façam rir. É como falar em ética hoje em dia: um toll free number chamado dial-ética está em perigo.

Passando o portão onde – até hoje os poloneses mantêm a metálica “inscriptia” art-nouveau Arbeit Macht Frei – só pensei em forrar a barriga: e logo com o quê? Eu só tinha duas opções: uma barraquinha de sorvetes e outra com hot dogs. Nada kosher, mas estava pouco me lixando. O elenco inteiro da ópera inacabada Zaide, de Mozart, estava lá comigo derretido em prantos, lágrimas de crocodilo (ninguém era judeu, todos vindo daqui, de Nova York para ensaiar com Luciano Berio essa miséria de Mozart em Cracóvia: olha que prato cheio para o Sergio Porto e seu febeapá!), e eu queria comer um cachorro quente e assim o fiz. Sim, depois de ver os membros da minha família exterminados, me deu fome. Fazer o quê?

Indignado comigo, o elenco ficou com cara de ponto de interrogação, assim como eu fiquei com o convite do Julian, assim como fiquei quando vi Beckett pela primeira vez, ou quando Haroldo de Campos escreveu páginas a respeito do meu trabalho: como diretor, autor, sei lá, sempre tenho que dizer alguma coisa. Não sei muito bem se disse antes ou depois de meter os dentes no cachorro quente! E que cachorro quente! Convulsionei.

“Wer fremde Sprachen nicht Kennt, weiss nichts von seiner eigener”: Pronto, devo ter murmurado algo em “goethesprache” para deixá-los ainda mais de queixo aberto.

“Quem não conhece línguas estrangeiras nada sabe sobre sua própria”, é linguagoethe! Ou dollargoethe, ou eurogoethe ou, na época, marcogoethe ou pontogoethe, ponto zero, Ground Zero: Auschwitz: para calar aqueles que não calam na hora certa, como eu.

Mais uma vez, em Auschwitz, as ruínas estavam lá. Mas eu estava de pé, com um cachorro quente na mão, curiosamente pensando em Haroldo de Campos me falando sobre “Deus e o diabo na terra de Fausto”. Mas logo ali? Logo do lado de fora do maior campo de concentração da História? Bem, não visitei os gulags na Sibéria. Não visitei o Camboja de Pol-Pot. A mostarda estava ardida demais. Aqui estávamos perto de Katovice e das minas de sal subterrâneas: 400 quilômetros de minas de sal, uma cidade inteira esculpida, com catedral e tudo. Uma loucura essa Polônia de Polonius! Ora alemã, ora Francesa, ora Russa, ora… Polonesa, um dos poucos umbigos da Europa. A Polônia de Copérnico. Copérnico, aquele que olhava para as estrelas, galáxias, para o universo, aquele universo sobre o qual esse mesmo Haroldo me falava tanto e com tanta rapidez, uma rapidez às vezes difícil de acompanhar, de…

Eu, uma pedra na mão, mas nenhum mandamento, nenhuma ideia, somente um nó na garganta, esperando nenhum Godot ou nenhum Moisés, ou sequer um semiólogo.

Não era 11 ou 12 de setembro, mas dessa vez com uma pedra histórica entalada na minha garganta. Ninguém do elenco, tenores, barítonos, sopranos, ninguém sabia nada – de verdade – sobre as minas de sal de Katovice, sobre os campos de concentração, sobre os regimes totalitaristas, seja a ditadura de Pinochet ou de Videla, ou o Golpe de 64 no Brasil, ou como  Stálin mandou o Siqueiros matar Trotsky com um machado na cabeça, seja sobre o que já rolava na época (1995) em Sarajevo e na Croácia e em Kosovo.

Era Slobodan Milosevic, hoje um presunto em Haia. Tudo em nome de limpeza étnica. Seres humanos se livrando de uma pele que não gostam, ou que repugnam, ou se olhando no espelho e se livrando de algo a respeito de si mesmo que os repugna: sempre a mesma coisa.

É por causa desse princípio imoral que mentem e mentem e mentem e mentem para nós todos os dias. Mas a pergunta me intriga a tal ponto às vezes que não consigo mais escrever ou sair para dirigir meu elenco: até o poder tem que ter seus limites, porque até Dick Cheney tem que fazer um exame de próstata e levar um dedo no cu, ou não? Como é o coco que a Rainha Elizabeth faz? É de manhã quando acorda? É de tarde? Ela sente a dor de barriga no meio de uma reunião com presidentes de outros paises, ou quando está na carruagem de ouro andando pela Mall e é induzida quando vê os cavalos “reais” cagando sem parar na frente dela? Como funciona o sistema intestinal dela? E como funcionou naquela madrugada quando ela recebeu a notícia de que a Princesa Diana havia morrido naquele acidente em Paris?

Talvez o mundo sempre tenha sido desse jeito porque esses extremistas que praticam a Guerra só foram levados a isso porque não conseguem de fato trepar, ou melhor, trepar usando suas fantasias sexuais com toda a liberdade a que têm direito. Os islâmicos radicais ou os judeus hassídicos ou cristãos evangélicos, ou qualquer religião que precise berrar como um animal e que cobre suas mulheres e as tratam feito eu-não-femismos: pare, Sr. Gerald, você já está divagando de novo!

Chega disso.

Preciso me lembrar de como é estar sentado no embankment do rio  Thames, lá em Putney, na Londres que é só meu, todo ele meu, quase debaixo da Putney Bridge… vendo os barcos passarem, vendo alguns junkies se picando, vendo alguns irlandeses bêbados dormindo homeless, homeless, homelessness, lessness menos ainda que lessness. Comentei isso com Beckett décadas depois, ele nada falou.  Essa Londres que é só minha é a Londres de Shakespeare, o solilóquio de Próspero em A Tempestade que não se dá sequer na Inglaterra, mas na ilha de Sycorax, onde o ex-Duque de Milão solta seu Ariel, manda o “livro das magias” à merda e perdoa seus detratores, delatores, perdoa seus críticos. Eu jamais faria isso. Não tenho esse tipo de maturidade, de generosidade e me pergunto por quê!

Se A Tempestade fosse minha última peça (e eu já a montei tantas vezes e me identifico tanto com ela, como pode, meu deus?), eu daria para ela um final trágico, com sangue. Mas a beleza dela reside justamente no fato do Shakespeare ter olhado para o Renascentismo, para o futuro de deus no Homem e em Leonardo, e ter tido esperanças. Sentado em Ground Zero ou em pé, com meu pain a plataforma que olha de uma Berlin para outra, não tenho esperanças. Hoje, quando escrevo, com o Iraque do jeito que está, e prestes a invadirmos o Irã, menos esperanças ainda.

Na década de sessenta, quando adolescente (casei em Londres muito jovem), eu costumava a fazer longas, muito longas caminhadas. Algo que eu herdei do Rio, onde eu andava do final do Leblon até o Museu de Arte Moderna, pela orla, sem problemas: era para ver um filme na cinemateca ou ter aulas com o Ivan Serpa. Ou aqui em Nova York, onde se anda, anda, anda. Só no “arrego” final, depois de andar do SoHo (na época ainda um deserto de pequenas fábricas de pregos e caixas de papelão) até o Harlem, é que eu pensava em pegar um “checker” cab, daqueles “tratores” lindos, assim como os táxis londrinos são lindos. Tão lindos os de Londres, que assim que tive algum dinheiro, comprei um, desativado. Me divertia com as pessoas fazendo sinal para que eu parasse, já que eu era um “daqueles pretos” como os outros. De longe não havia diferença, somente uma plaquinha branca atrás que habilitava ou não o táxi em si e mantinha distância entre a verdade e a ilusão. Era um Winchester diesel que, ao subir o Haverstock Hill, em Belsize Park, por exemplo, sofria.

Eu havia caminhado de – sei lá onde – de Southampton Street em Covent Garden, onde ficava a sede da Amnesty International, ate Putney, umas belas seis milhas. E sempre observava os tijolos vermelhos ou marrons ou terracota das casas por onde eu passava. Dependendo da época em que foram construídas essas pedras, esses tijolos, tinham uma beleza muito especial e sua maneira de maçônica de serem colocados, gentilmente, uns sobre os outros, era lindo, era, de certa forma calmante.

Como pode algo assim ser destruído? Minha obsessão em preservar é doentia.  Fogo, brigadas de incêndio, o  incêndio em si, terrorismo, esse mega incêndio que consome agora o sul da Califórnia é algo que me deixa doente. Com água eu ainda consigo lidar, mas fogo é algo que… No meio da King’s Road existe um lugar chamado “world’s end”, o “fim do mundo”, onde os tijolos, aliás, não são tão bonitos. Muitas folhas no chão, sempre, não importa a época do ano. Nem precisa ser outono.

Não sei porque, com a pedra na mão, sentado ali no rubble do World Trade Center, me vinha à cabeça aquela curva da King’s Road em Londres, o “world’s end”, me vinha à cabeça o arco “Arbeit Macht Frei”, me vinha à cabeça o meu pai olhando a sua Berlin dividida e sem nada tendo a dizer, como o personagem de Ohio Impromptu de Beckett, esse world’s end representa e interpreta algo que Goethe, ainda prefeito de Weimar, quis dizer e não pode, ou seja: “pouco resta a ser dito”.

E agora, com tudo isso e mais na cabeça, penso em George Bush como um Inquisidor, um real raivoso evangélico que em seus aforismos não faz alegorias, incapaz de fazer fantasias, é um militante religioso daquilo que representa o seu Sol, seu solstício, um mito do zodíaco transformado em homem e transformado em mito de novo, pois homem não tem ressureição. E nessa cruzada capitalista pelo poder do petróleo e pelo domínio, ele deve achar válido o sacrifício de vidas humanas, assim como em todas as religiões as vidas humanas não valem nada, frente à vida desse que é a personificação do sol, o filho de deus, a antropomorfização de um símbolo numa catarse maior e demiúrgica ou demagoga, a reflexão de um ser superior que espelha as constelações e seus discípulos e é sacrificado por suas profecias. Pobre Jesus!

Quando não penso em nada, penso em Goethe, não no escritor, não no poeta e não no cientista, mas no modernista, naquele que começou a romper com seu passado. Não, isso não é verdade. Quando não penso em nada, não penso em nada e pronto. Que absurdo dizer que penso em Goethe! Que arrogância! Mas é que, de certa forma, meu pai lia Goethe para mim, quando eu era algo antes de criança e brincava nas ruínas daquilo que eram os sons do “holocausto na cabeça”, as memórias que a família trouxe e que nos acompanharam por tudo que é lugar. Essa linguagoethe me era cantada sim, e de alguma forma isso ficou aqui dentro como música. Se destruí o meu passado, ou fiz meu pacto com o futuro, ou com o meu palco por causa disso, bem, isso é para as pedras ou pros psicanalistas e acadêmicos decidirem.

Só sei que nunca serei um Goethe. Nunca mais teremos um Goethe. Hoje os inventores são cientistas anônimos, e os intelectuais são somente repetidores, acreditem. Goethe inventou ou introduziu a Einbahnstrasse, a rua de mão única, o que veio a ter um efeito urbanístico no mundo incrível: viramos um enorme quarteirão, o conceito de cidade moderna. E veio a Bauhaus, Gropius com seus quarteirões verticais onde moramos até hoje (e daqui do oitavo andar o East River me parece morto mesmo!), nessas gavetas impessoais e imorais do ponto da claustrofobia e neurose, como se prisão fosse a penalidade máxima e como se já não morássemos nela e pagássemos tão caro por ela.

Pedras na mão, ou obstáculos que chutamos por aí sem se dar conta. Olhar para cima, às vezes, nos faz bem. Existe um céu, quando não há incêndio ou alguma fumaça ou nuvem nos impedindo a visão do céu claro ou do universo. Mas essa visão pode nos levar à morte instantânea! Eu, pelo menos, tomo cuidado.

Não, nada disso me passava na cabeça enquanto estava sentado debaixo da Putney Bridge. Mas me passavam os nomes dos presos políticos do mundo, esses que eu tinha que decorar para reunião da Amnesty International do dia seguinte. Sim, ainda estamos nos anos 70 e Yehudi Menuhin está prestes a apresentar o Nobel da Paz que a Amnesty ganhou em Oslo e estamos todos em pleno Royal Albert Hall.

Menuhin vem ao microfone, emocionado e anuncia o premio. Todos na plateia aos prantos. Menuhin também. Ele se recupera da emoção, pega o arco e violino e retoma um movimento da Nona Sinfonia de Beethoven, a que menos gosto, essa que virou o hino da Europa Unida agora. Mas é a mais popular das sinfonias, funciona como um Julio Iglesias para o povo, e o povo no Albert Hall assim reagia. Eu não sabia se vomitava ou celebrava. Por que um premio tão merecido sempre tem que terminar em bregalha?

Anos passam. Coloco minha obra de pé. Viajo mais não sei a quantos paises? Quantos? Uns 16, contando com as viagens pela Amnesty e o início da minha carreira de dramaturgo e ilustrador. Não sei. Perdi as contas e não contabilizo mais. Quando o avião decola, geralmente estou anotando algo (um artigo como esse ou um trecho para uma outra peça qualquer, ou um email para alguém, porque no fundo somos o que mesmo? Sim, seres em busca de outros seres em total descompasso e sempre na culpa, sempre na culpa, sempre tentando recuperar o tempo perdido, sempre tentando explicar assim “olha aqui querida, mil perdões por não ter te respondido antes mas…”

O que quero dizer é que estou, ou melhor, me encontro sempre assim: sentado, ou de cócoras, seja com uma pedra na mão ou jogando pedrinhas ou olhando um monte de ruínas de um prédio colapsado. E a pergunta perdura. E daí? Se construí uma obra teatral, sempre volto para o ponto de partida que é HOJE, que é o NADA, que é esse vazio enorme aqui em Nova York, onde me falta TUDO… onde não tomei precauções para ter água mineral suficiente, onde estou em estado de euforia, ansiedade e depressão e, como cresci e fui educado com o holocausto na cabeça, nada mais me resta a dizer, senão um muito obrigado por tudo que tive a chance de enxergar através dessa enorme cegueira que sou eu mesmo, através dessa enorme cegueira que são minhas obsessões e que me obrigam, como se assim fosse, a colocar no palco, uma paródia, sobre o porque dos silêncios nas peças de Harold Pinter.

Meu dialogo dramatúrgico está, de certa forma, reduzido a um objeto de desejo, melhor dizendo, a uma maquina do desejo Proustiana (perturbada, num passado ou tempo perdido e irrecuperável) onde o cisne (Swann in Love) grudado ali na parede de um camarim de uma “Terra em Trânsito” (essa última peça que eu escrevi e encenei),  conversa com sua musa, uma soprano que espera o final do terceiro ato de Tristan und Isolde para entrar em cena para cantar e viver o seu Liebestod, seu último ato, sua última ária.

Como já encenei essa ópera várias vezes, sei que ela é, de certa forma, o Wagner em pessoa, assim como A Tempestade é Shakespeare em pessoa, olhando para o futuro, e não terminando em sangue. Em Tempestade, Shakespeare pede aplausos para a sua própria libertação daquela ilha/palco/prisão. Wagner, em Tristan, me parece não ver futuro a não ser através da morte dentro do amor e vice versa. Minha “Terra em Trânsito” propõe uma profusão de ideias, uma contagem regressiva e urgente de notícias do século XX, assim como alguém que já viveu os últimos momentos antes da morte os reconta. Mas enquanto ELA é o objeto de desejo DELE (o cisne), ele está ali imóvel e nada pode fazer, assim como Winnie está enfiada num monte de areia em Happy Days de Beckett. Isso acaba dando num efeito oposto e sádico (de Sade mesmo) onde ELA acaba alimentando aquele que mais a admira com migalhas velhas de biscoito ou “pão cristão”, para que ele, o cisne, seja enviado a Strasbourg pra virar patê de fígado, ou melhor, uma “pasta de si mesmo”, assim como todos nós viramos uma miragem de nós mesmos: foie gras – uma invenção grotesca e comestível que engolimos e consideramos uma delicatessen!

E num diálogo entre ELA e o CISNE num trecho de “Terra em Trânsito”, eu pinto com o Sr. Haroldo Pinto, português, judeu de nascimento, mas hoje um conceituado e chatíssimo autor chamado Harold Pinter:

“Antes de te mandar pra Strasbourg eu ainda tenho que mandar fazer um exame das tuas fezes e  urina pra ver se você não está com essa gripe aviária. Esse teu xixi não anda me cheirando nada bem! Também com tanto suplemento. A culpa é minha. Tudo bem, a culpa é minha, é um tal de te dar antioxidante, vitamina E, C, B12, Pancreatina, lactase, Zinco quelado, Boro quelado, amilase, Manganês, Magnésio, Selênio, Cálcio, Ferro, própolis, dmae… ufa! Não é à toa que… Você está me cheirando a uma peça de Harold Pinter. (Pulo Grande. Para a plateia) Gente! Entendi tudo! Os silêncios na peça de Harold Pinter: não são problemas emocionais, não são pausas que catabolizam uma emoção que se ‘puxa’ pra dentro, uma introversão, UMA COISA INTRINSICAMENTE BRITÂNICA, UMA ESPÉCIE DE SÍNDROME DO BLOQUEAMENTO DA PASSAGEM DOS SENTIMENTOS PELOS NEUROTRANSMISSORES IMPEDINDO A COMUNICAÇÃO ENTRE CÉREBRO E CORAÇÃO E, PORTANTO, REPRIMINDO TODO  PROCESSO DE EXPRESSÃO PELAS VIAS EMOCIONAIS, OU MELHOR, A NÃO EXPRESSAO PELAS VIAS EMOCIONAIS,  PORTANTO, CRIANDO TODA UMA SOCIEDADE FUNDAMENTADA NA CULTURA DO NÃO-DITO, OU MELHOR, DO DESDITO, OU, MELHOR AINDA, DO MAL-DITO. SIM, NÃO, QUER DIZER, nada disso. É que um personagem está tentando desvendar o cheiro do outro, já que todos ali estão super medicados. Vindos de um National Health Service (Serviço Nacional de Saúde) em total decadência, os médicos começaram a receitar qualquer negócio e estão, os aristocratas, digo, a tomar qualquer tipo de solução, mineral ou não mineral, e ficam todos num silêncio (pausa) sepulcral tentando entender o que o outro está tomando, já que na Inglaterra não se tem essa abertura pra perguntar assim: ‘Hey, Joe, o que é que você está tomando… hoje, now, I mean, today?’”

Chega disso!!!

Essa voz é agora (espero), é definitiva. Ficar amolando, chateando outros autores quando nem eu mesmo me resolvi ainda. O que é isso, minha gente?

O autor, o encenador, esse  artista aqui, enfim, é o eterno efêmero, enfermo. Sempre se despede de tudo, nada lhe pertence. É o tal do Weltschmertz. Dor do mundo. Portanto, andar pelo mundo significa andar pela dor. Ah, agora me entendi melhor. Andar pelo mundo significa andar pela dor. Uau!

É como encarar a mulher que você ama nos olhos, depois de dias tão intensos, promessas tão intensas, e ter que lhe dizer um simples “adeus, te cuida. Me promete que você vai se cuidar”.

Como conviver com a despedida? Com essa coisa de “não se ver mais”? Essa sensação de se estar “espalhado” por tudo que é lugar, com promessas de amor e devoção é, desesperadora.

Sempre irei tentar colocar uma âncora em algum lugar, ou melhor, me ancorar em alguém ou em vários alguéns, mas a solidão é algo insuportável, assim como um palco vazio, ou uma tela em branco (mesmo o branco sobre o branco de Joseph Albers), ou uma página em branco, ou duas torres brancas que predominavam no meu skyline, tombado, no seu sentido mais perverso. Não, âncora nenhuma não. O palco estará vazio ainda ou redundante, até que se resolva essa loucura que é a finitude da vida. E ela, a morte, dá margem a qualquer tipo de pacto, seja ele qual for, porque, sei lá, não quero ser Bergman, não quero estar no lugar do Zé do Caixão! Quero andar em cima da minha dor, mas ainda assim tocando o samba que tão bem sei tocar. Duvida? Pergunte ao Ivo Meirelles. Toco, e com muito orgulho, todos os instrumentos, com as duas mãos, na superfície de uma mesa como poucos cariocas sabem batucar!

A despedida é algo com a qual – nessas décadas todas – ainda não aprendi a lidar. Seja dizer “adeus” a uma pessoa ou a uma cidade, seja a um cartoon de Steinberg ou a uma tela de Rothko que se suicidou ao olhar o que ele mesmo pintou.

Roxo sobre Lilás e tons de violeta e… o amarelo que Borges via em sua cegueira enquanto liam pra ele Coleridge na Biblioteca Nacional de Buenos Aires. Sim, aquele Borges que veio a ser caricaturado, não por Steinberg mas por Humberto Eco, em “O Nome da Rosa”, o bibliotecário cego com seu assistente corcunda quase incendiado. Borges era fanático pelo Zodíaco. Cortázar também era. Escreveu “Prosa ao Observatório”, um texto lindo e livre, como um solo de jazz, de Charlie Parker, lá das ruínas da cidade de Jaipur, na Índia, um enorme observatório, um gigante, assim como o próprio Cortázar era um homem que não parava de crescer e não conseguia nunca se despedir de seus exilados políticos quando trabalhava comigo no Tribunal Russell. Chorava e chorava muito. Cada um chora seus mortos. Eu chorei os meus. Muitos deles.

Faz tempo. 23 anos que meu pai morreu. Fui à luta. Numa dessas idas e vindas rápidas entre Nova York e Rio ou São Paulo, sendo que três dias foram em Stuttgart pra supervisionar “Perseo e Andromeda”, uma opera de Salvatore Sciarrino que estava sendo “ressuscitada”, mais ou menos como se ressuscita no Zodíaco ou na Bíblia um mito para pegar o seu dinheiro ou para te colocar em regimes de guerreiros, eu resolvi criar um banquete e convidar todos os meus “amigos” do British Museum Reading Room e da farra na vida em geral, desde Kant até Descartes, desde Arthur Koestler até Ivo Meirelles, desde Karl Marx até David Letterman até, sei lá. Estavam todos lá.

Minto. Faltavam Hunter Thompson e seu convidado especial, recém-falecido, o jornalista televisivo Ed Bradley, do 60 Minutes. Thompson havia telefonado de Montana dizendo que seu avião estava atrasado. E Faltava David Mamet, que, aliás, jamais havia confirmado presença, assim como Woody Allen não havia confirmado presença, assim como tantos outros eu havia convidado, ou achava que havia convidado: Frank Gehry por exemplo. Mas… nada. Nada deles aparecerem, então: não estavam “todos” lá. Uma parte deles estava lá. Só uma parte.

Cabisbaixos, maltrapilhos, mas lá. Wittgenstein chegou no meio do jantar ainda escrevendo uma carta ou um aforismo e nem se deu conta de nada. Na cabeça dele, ele nem saiu de Viena. Quem me deu o toque foi o Stephen Toulmin. Falou assim “Olha lá o Wittgenstein… andando por ali, pelos corredores, pegando uma garrafa e não dando a mínima pra nós.” Notei. Notei e fiquei ofendido.

Schiller estava ofendido porque todos estavam prestando muita atenção em Goethe, digo, muita atenção mesmo, já que Goethe sempre foi a “estrela histórica”. É, existe isso. Digo, essa coisa de estrela histórica como Beethoven, como Chaplin, como Wagner ou como Lenin. E… Chega disso! Ih, voltou essa voz com esse “chega disso”.

Minto. Minto para não ter que dizer que digo a verdade. “Quem não conhece culturas estrangeiras não entende a sua própria”. Pronto! Me apropriei de Goethe. Estendi língua para cultura, já que uma lambe a outra, já que não há diferenças mesmo. Já que o choque cultural é o grande responsável pelos desentendimentos, pelas guerrinhas regionais, as emboscadas, as pegadinhas. Não, não vou entrar em como e por que se faz uma enorme grande Guerra, existe gente qualificada pra isso.

Minto brabamente. Sou qualificado para isso. Mas me dá uma sensação estranha de estar preaching, e odeio isso. Não tenho essa obrigação didática, aliás, quero correr dela, o mais rápido possível, riverrun, algum rio, seja o Rhein, seja o Thames, seja esse East River aqui embaixo de mim que contamina a água da minha torneira, uma água turva e morta. Ah, esse rio… turvo e morto, riverrdead, or riverdeadhead going to bed.

Essas caminhadas pelo mundo não me levaram à toa por aí. Levaram meu teatro: o teatro do qual sou autor. Se me sinto confortável com isso? Sendo ouvido em alemão, em dinamarquês, em italiano, em servo-croata, em russo em sei lá o quê… tudo porque eu cresci e chorei junto com meus pais tantos fracassos e tantas mentiras de uma família em pedaços, em ruínas, nunca tendo exatamente um rumo certo, nunca tendo exatamente uma certeza de que “eles” não iriam marchar contra nós no dia seguinte apontando o dedo no nosso nariz dizendo “amanhã estaremos de volta, uniformizados e vocês serão cinzas”. Sim ouvi isso durante a infância inteira. Ouvi isso vendo as mãos tremendo, goles de não sei o que descendo goelas abaixo, não sei quantos foram os paises. Ouvi isso durante aquela noite inteira de 11 a 12 de setembro de 2001. Mas e agora?

Talvez por esse motivo a minha pressa louca em atravessar a Williamsburg Bridge e atravessar as barreiras militares e policiais pra conseguir um pedacinho de detrito, e sentar no chão de poeira, de rubble, de cinzas, pedaços de corpos fervendo naquele instante ainda, uma cidade zumbi: um pedaço de pedra na mão, assim como segurei um pedaço do Muro de Berlim na mão por anos, e hoje ele está plastificado num prato, parte da obra de arte de um escultor dinamarquês.  Muros, prédios, obstáculos, fumaça, cortinas, armários, coisas escondidas, tudo parte de uma geração que enfrentou, assim como eu enfrentei, as filas de carro em Checkpoint Charlie ou em Bahnhof Friedrichstrasse, tentando ir para o lado oriental de Berlin. Sentado com um ator de pequeno porte do Berliner Ensemble (muitos anos antes do muro cair) tudo que ele queria, era se esconder dentro do meu carro antes que eu atingisse o limite de horário: 23:59 em ponto. Hora da saída obrigatória da DDR, da Alemanha Oriental. E… liberdade! Liberdade? A liberdade dos produtos. A liberdade do consumo!  Que loucura! Em três minutos, o mundo mudava três décadas e saía do regime de Honecker com seus peixes podres dos supermercados “marxistas” (que piada) e voava-se  diretamente  pro grossen laden KDW, e seu último andar luxuosíssimo onde se come de tudo. Tudo, de Bocuse ou uma carambola até Wocluse, aquele lugar misterioso que Didi e Estragon debatem em Godot.

Quando, numa coletiva de imprensa para o Wiener Festwochen em 89, num café repleto de jornal, TV e o escambau, percebi que eu teria uma “voz” nessas áustrias e alemanhas e que uma piada do tipo “vocês se importam se minha família se juntar a mim agora?”. Explico: a cena era eu. Eu na frente dos microfones exibindo um cinzeiro cheio, transbordando com cinzas. Nenhuma graça, nenhum sorriso. Eu ri. Meu deus, depois de décadas, será que não podemos rir um pouco disso?

Teve que intervir um certo Gerd Gliewe, da Abendzeitung de Munique, para fazer as pazes entre eu e o passado das germânias, essas germânias sobre as quais Heiner Mueller escreve.

“Das Universum im Kleinen Format” foi a matéria! E que matéria!

Parece que deu certo. Proponho um certo humor nessa questão do nazismo nas Alemanhas até agora não tão unidas, afinal, a geração atual realmente nada tem a ver com isso. Ou será que tem? Os skinheads me esperavam do lado de fora em Weimar durante o triste episodio do Breve Interrupção do Inferno (A Brief Interruption of Hell). Também me esperaram em frente à saída dos artistas na Ópera de Graz, quando encenei “Moses und Aron”, de Arnold Schoenberg. Sim, eles existem, os skinheads, e te metem garrafas na nuca como se estivessem vindo de um cartoon mórbido de Crumb. Botas largas demais, calças curtas demais, e crânios pequenos, seus physique du role dizem a que vieram: a nada. Mais que isso – até hoje, não fazem, só Berram. A banalização do mal? Não, somente a banalização do medo! Eichman puro!

Foram tantos os países e tantas as línguas. E para quê? Juro que não sei responder. Se houvesse um ato triunfal no final de tudo, algo heróico, eu seria o primeiro a querer dizê-lo. No muro das lamentações, em Jerusalém, me dei conta, talvez pela primeira vez na vida, de que eu era capaz de ouvir o canto dos passarinhos. Achei irritante. Mais irritante ainda, a Mesquita que fica do lado de lá, irradiando pelo alto falante, cantos islâmicos para irritar os passarinhos e os judeus ortodoxos que ali se curvam e, num movimento mântrico, não param de se mexer, de trás para frente, de frente para trás.  Ali me dei conta de que todas as pedras que segurei esses anos todos estavam todas lá, amontoadas, até aquelas pedras etruscas em que me segurei emocionalmente enquanto morei na Toscana, no ano em que me enfiei, casado com uma mulher e um teatro, no centro belíssimo da Itália. Todas as pedras numa só pedra. Não é metáfora, principalmente porque todas aquelas pedras estão, de certa maneira seguras pela mega-pedra de Herodes, aquele mistério pesado, enigmático, emblemático, tal qual as pirâmides, só que no subterrâneo do muro das lamentações.  Isso, em Jerusalém, aconteceu quatro meses antes dos ataques de 11 de setembro de 2001.  Eu ainda achava bastante estranho ver um policial portando uma Uzi, mesmo tendo subido a Mangueira aos 13 anos, junto com Helio Oiticica, onde vi outras semiautomáticas mas que, juro, não me impressionaram tanto.

Os tempos eram outros, e as ruínas ainda não estavam tão deterioradas quando se brincava de ser menino.

Mas e agora? Perdi de vez a inocência, demoli tudo. Eu e nós mesmos. E em meu lugar? Pedaços de mosaico que não consigo mais reconhecer como sendo meus. Procuro loucamente quem sou e/ou como somos. Não tenho respostas. Nossas identidades? Um caos. Estamos espalhados e refletidos, como esquizofrênicos, nós, eu, você, em cérebros de outros, como se não habitássemos por inteiro aqui dentro. Como se quiséssemos fazer alguma diferença no mundo de hoje, como se nosso berro não fosse aquele de Munch, o silencioso, como se ainda tivéssemos o poder do protesto de Dylan, de Abbey Hoffman, de Hendrix, mas estamos soltos e nossas mentes com plugs de Ipods como se fossem rolhas para não deixar escapar pelos ouvidos o que nossas bocas querem berrar. E se quiséssemos berrar, qual som sairia, já que nada temos mais de original para dizer, nada temos mais de inteligível para berrar? Todos os editoriais são iguais, todas as lamúrias são iguais, nossa poética está na seca, assim como o aquecimento global. Parece que fomos achar conforto num chat com um anônimo através do Skype com câmera, na certeza de que podemos clicar “terminate” e acabou. Mas acabou? Nossas solidões estão todas medicadas. Não há ninguém desacompanhado de um discurso horrivelmente triste, mesmo aqueles com um sorriso estampado na cara ou com sessão marcada com seu psicanalista ou com seu traficante ou em seu quarto escuro e com sua medicação legal.

Somente ruínas. Não as aceitamos ainda, mas se nos olharmos do alto, somo ruínas vestidas, alguns bem, alguns mal, alguns de Prada outros de Commes des Garçons e outros de pé no chão mesmo, tudo rasgado. Mas ruínas mesmo assim. Sinal de um tempo de tremenda mudança. Sou a favor, não me interpretem mal, mas a solidão da mudança significa que aquela casa não estará mais lá, os móveis serão queimados, como na Krystalnacht, quando as lojas dos judeus foram quebradas ou as lojas dos islâmicos foram metralhadas depois de 11 de setembro e … tudo por quê?

Porque uma vez eu abri o armário quando menino e brincava de fazer teatro com as poucas coisas que tinha, com medo da rua: medo das automóveis cujos pneus, sem querer, jogavam pedras para lá e para cá e machucavam pessoas, me machucavam. Pedras, mendigas, armários barrocos onde eu achei meu “drama” por pura covardia, mas tudo isso deve estar lá onde eu brincava quando menino.

Mas onde será que foi aquilo?

Gerald Thomas

New York – October 2007

 

 

 

 

 

 

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Simonsen na VEJA e a picaretagem de se fazer uma crítica de uma ópera sem que ela esteja pronta:

Não quero a-vaca-lhar muito a coisa mas, aqui está algo entalado

na minha goela desde 1987 – uma crítica de Mario Henrique Simonsen

pra VEJA que foi feita da seguinte maneira:

– O elenco que estava no palco era o elenco B (não ensaiado)

– Não tinhamos orquestra no fosso. Era ensaio com piano e o elenco estava “marcando”

– Os figurinos, a luz e o cenário não estavam prontos. Ou seja, a “magia” da coisa não estava

lá. Mas o ministro da Fazenda “precisava” fechar a materia! As fotos entrariam depois.

Ele se enfiou nas ultimas fileiras do teatro. No escuro. Eu não notei. Era um grupo de pessoas.

Poderiam ser técnicos. O resultado está na matéria ai embaixo.

Quando, na ultima recita, a TV Cultura transmitiu ao vivo, chamei o Simonsen de ladrão. Foi pouco.

“Picareta” teria sido mais apropriado.

 
VEJA 1VEJA NAVIO FANTASMA
VEJA - 3

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Aderbal Freire Filho : conte com todo o meu apoio (se é que isso vale alguma coisa)

ADERBAL

Meu total APOIO ao ADERBAL FREIRE FILHO !!!

Um recado amigo pra vc meu querido:

Voce não está num tribunal. A revista “IN-VEJA” não é uma corte e vc não deve explicações a ninguém. A tua obra fala por si. A Veja incrimina todo mundo. Seja “feliz” por terem te “perseguido” aos 75 anos (rs). Vieram atrás de mim em tantas fases da minha vida que….já acho que é fetiche !!!! O mesmo com quase todo mundo que “construiu” alguma coisa. Te mandei um email. Não ligue não. Um super beijo. LOVE 

Gerald Thomas

PS: Não me importa a quem ou ao que vc está filiado. Caguei. Eu não voto no Brasil, não gosto do PT e pronto. Essa minha posição é clara ! Mas não se pode e não de deve perseguir ninguém pelas suas convicções políticas !!! Foi isso que o Macartismo (McCarthysm) fazia com sua caça as bruxas e suas black lists na década de 50. Deus me livre ! DEUS ME LIVRE!!!!!

Um enorme beijo

Saudades

GT

PS : Post do Reinaldo Azevedo: onde tudo começou: tirem suas próprias conclusões: 

http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/os-salarios-pagos-pela-tv-brasil-ajudam-a-explicar-o-petismo-feroz-de-alguns-jornalistas/

(NYC)

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I was feeling kind of low…but then…. Harry Belafonte !!!!!

But then……well…. I saw “SIR” Harry Belafonte deliver this incredibly beautiful speech in honor of Carlos Santana and everything changed. Yes, Harry Belafonte ! The occasion? The Lincoln Center Honors, 2013, edition. Ah, but it got better: In walks Buddy Guy ! Oh man! The chemistry and the fun – and the…. 

…. I’ll leave it up to you to decide.

I was never much of a “Santana” man, up to this moment, now, today.

This retrospective – of sorts – has changed me.

Gerald Thomas

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“Estupro Coletivo” no Rio – COVARDES, animais! Pena de Morte, lenta e linchamento, começando pela castração!

A JESUSSobre esse caso do estupro “coletivo” (como está sendo chamado). Eu peço mil perdões por não ter prestado atenção antes – apesar das postagens que vi da “a” Jesus feminina sangrando….(simplesmente não me dei conta). Mil vezes sorry. 

Somente agora me dei conta realmente do que se trata, lendo in full a reportagem da Folha. Num caso desses, sou totalmente a favor do LINCHAMENTO desses animais ! E sem piedade. Castrem esses (….) aos poucos, lentamente, de cabeça pra baixo – pra DOER mesmo… e deixem os caras la, pingando, sangrando de cabeça pra baixo….morrendo aos poucos. Filhos da PUTA!!! Nossa, que ódio. QUE HORROR ! Trabalhei 6 anos na Amnesty International em Londres na década de 70 – e deveria ser contra a violencia mas… caguei. Quero esses caras MORTOS! 

PS: Já escrevi várias vezes a respeito desse assunto, especialmente depois do infeliz incidente “Nicole Bahls” (Panico na TV), um programa escroto e combinado que vem estragar a nossa festa: mas, o que o espectador não sabe, é que nós, artistas, todos rimos. Não passa de uma encenaçãozinha de merda. E todos acreditam.

Aqui está o artigo de Dezembro passado: https://geraldthomasblog.wordpress.com/2015/12/18/a-cultura-do-estupro-no-brasil/

 Gerald

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The incredible graphic work of Victor Hugo Cecatto: based on my body and my work and my body of work:

VHC !VHC 2VHC 3VHC 4Victor Ceccato 4

Absolutely GORGEOUS !

CONGRATS!!! Victor.

LOVE

Gerald

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Nearing the end of my “reality fiction” novel, “The Lost Case of a Brief Case….”

"Coffee on paper" - a bloody throne" (London 2003)

“Coffee on paper” – a bloody throne” (London 2003)

 

LOST CASE – Penis Transplant”

Twice a week or so, loaded with bodies boxed in pine, a New York City morgue truck passes through a tall chain-link gate and onto a ferry that has no paying passengers. Its destination is Hart Island, an uninhabited strip of land off the coast of the Bronx in Long Island Sound, where overgrown 19th-century ruins give way to mass graves gouged out by bulldozers and the only pallbearers are jail inmates paid 50 cents an hour.

A man whose penis was removed because of cancer has received the first penis transplant in the United States, at Massachusetts General Hospital in Boston.

Tim Water Mug, 78, a beer consumer from Birkenau, Texas, underwent the 36-hour transplant operation on May 8 and 9. The organ came from a deceased donor.

I want to go back to being who I was,” Mr. Mug said in an interview in his hospital room. Sitting up in a chair.

When penises are transplanted, divergent life stories come to the same anonymous end.

“No tombstones named “The Dead Penises” are anywhere to be found – that I know of”, I shouted. Essig and Zufall looked on in silence.

 – “Hey, People !!! Everyone !!!!”….. –  my head was spinning at 100 miles an hour. “Hey, People !!! Everyone !!!!”….. Did you know that… In September of 1935 the Nuremberg Laws were enacted ? And…did you know that these laws prohibited marriages between Jews and people of Germanic extraction and extramarital relations between Jews and Germans, and the employment of German women under the age of 45 as domestic servants in Jewish households?

I guess that people just weren’t paying attention to me. After all, who am I and what am I telling them about Birkenau if their concern is really the New York City morgue and the ferry that has no paying passengers.  

But I insisted. “Hey, People !!! Everyone !!!!”…..The Nazi ideology brought together elements of anti semitism, hygene and eugenics and combined them with …

With…

This is when my heart suddenly stopped.

I mean, my heart completely stopped.

Tim Water Mug himself, the man….he himself, walked into the room, I mean, the precinct.

Pre-Cinct presupposes something. What is a ‘cinct”? And what does it matter now that I’m all locked up in here?

I waved at Tim Water Mug, knowing about his new penis. I didn’t know what else to do. “Hey Tim, congrats on your new penis !!!”, almost at the top of my lungs.

Everyone around was dead silent.

He gave me the Rock Hudson look.

Tim waked steadily towards the central booking desk as if to make a complaint but, instead this is what I heard:

“ Officers, you won’t believe what just happened  a few hours ago, literally a few hours ago….. just as I was trying to get some sleep….you know…I had just come back from the hospital and…. There was this loud BOOM this loud BANG outside my window and….”

          Where do you live, Sir?

 “By the East River, it’s….called…Waterside Plaza”

 –Boy. I nearly fainted. What did he say?

 “This body – that’s what I think it was, a body – comes crashing down and, oh man! Before I could even realize what it was…. There was blood and guts and body parts… Oh, it was so disgusting….”

       You’re the man who had your penis transplanted, right? You know all about body parts…

 “Yes, but NOT LIKE THAT, I MEAN, NOT LIKE THAT !!! I was at a hospital”

 –“SIRS, SIRS, OFFICERS”, I cried as loud as I could. “SIRS!!!” “I REMEMBER HIM. I REMEMBER HIM THERE”

 Zufall and Essig in unison:

“YOU WHAT ???”

“He’s… he is….(Christ! I was stuttering!) he… he… was…. He.. this man…. HE! He was right there when…”

I woke up in the infirmary of the precinct. An oxygen mask firmed to my mouth and nearly strangling me…

…could not utter a word. My hands were tied to the metal bed by handcuffs – no officer in sight. I was, once again, sedated.

Is this, perhaps, the meaning of a “pre-cinct” ?

 Was I “pre-cincted” to be there and so…. Was Tim Water Mug “pre-cincted” too ?

All I could do was think, cinct, and nothing else.

I was lost. As always, I was lost.

I couldn’t afford to get sidetracked. That wasn’t an option.  I needed to be practical and…and come up with a solution.

Suddenly my mind was filled with my father’s name, it’s resonating sound “Dagoberto Müller.. Dagoberto Müller.. Dagoberto Müller.. Dagoberto Müller..”, as if a hammer hitting on a nail and that image of that burning piece of paper with those faint quaint words disappearing while my mother OH, my mother OUCH and my mother leaning heavily against the door screaming “BUT I TOLD YOU NOT TO… BUT I TOLD YOU NOT TO… BUT I TOLD YOU NOT TO… Dagoberto Müller… Dagoberto Müller… BUT I TOLD YOU NOT TO.. BUT I TOLD YOU NOT TO…” and this symphony all meant that I needed to prove my innocence and nothing else.

My innocence and nothing else.

I had been guilty since I was born.

My God! I had been feeling guilty since the day I was born and…. only now…

Guilt.

So…. What the hell ! Nothing else matters ! It’s really all about Zeena’s fall and those lost pages and and me. Who am I really ?

Is it perhaps that all these people parading in front of me from the very beginning are, perhaps, a kind of clue, a puzzle, made for me, only for me, so as to show me and only me who I really am, who I was, where I come from?

The land of no tomorrow?

Wow !

So, if that’s the case, is the lost brief case a blessing or a curse? Did it – perhaps – contain the enigma, the true papers of my biological origins, the ancestries, the tracing back of all that I am, was, will be?

Could Zeena really be all that she portrayed herself to be?

No, this is a court, surely. Isn’t it?  

Rehearsals will resume in 10 minutes”, said a voice over the PA system. 10 minutes everyone

 ???????

 “Mr Beck…. 3 minutes, please…” Mr Julian Beck…. 3 minutes please….”

 ????????

 The land of no tomorrow….but…what? the land of yesterday? Am I back where I started? Is he calling out for Julian’s name?

 Am I at La MaMa?

 “Mr Beck…. 1 minute, please…” Mr Julian Beck….  minute please….”

 Precinct ? A jail? A Prison?

WHERE AM I ?

 Julian? Julian? Are you here?

 Can you hear me?

 I get it. I get it.

 In “Theater 2”, by Beckett, two men carry brief cases on to the stage while the third one is blocked to stay still, stiff  almost like a statue, just as a marble column, his back to the audience, staring out of a dark window, lit only dimly by the moon.

These brief cases contain documents…

 JULIAN ???

 JULIAN???

 AM I THIS lost character staring out of the window throughout Theater 2 ?

 “Mr Beck, take your position, please…” Mr Julian Beck take your position please….”

 FUCKING CHRIST!!!! Those brief cases….tucked away in a storage space in Manhattan or somewhere…containing …if that’s the case, are they… the lost brief cases? If so… is that a blessing or a curse? Would they – perhaps – contain the enigma, the true papers of my biological origins, the ancestries, the tracing back of all that I am, was, will be?

 Or …merely, the originals or a Samuel Beckett play?


 

(Almost the end of The Lost Case of a Brief Case” – Copyright Gerald Thomas – London – New York 2016)

Screen Shot 2016-04-29 at 11.37.30 AM

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Boris Schnaiderman dies in São Paulo, age 99.

BORIS SCHNAIDERMAN

Ukrainian born Boris Schnaiderman died yesterday in São Paulo at the age of 99. He was absolutely fundamental and instrumental in building up the structures for the world of “Concrete Poetry” – the movement founded by Haroldo and Augusto de Campos and Décio Pignatari. Together with critics and other European intellectuals who sought refuge in Brazil, such as Anatole Rosenfeld, writer Clarice Lispector (also born in Ukraine) and Jacó Guinsburg, born in Belarus and owner of Editora Perspeciva, these intellectuals formed the ‘pillars’ of the Brazilian modernist movement. There would have been no “Tropicalismo” without them, thus, no Caetano and Gil and no Hélio Oiticica and so on.

Following a phone call from Haroldo de Campos, Guinsburg and Schnaiderman came to see my “Kafka Trilogy” and, a decade later, in 1996, Editora Perspectiva published two books about my work – “Encenador de Si Mesmo” (curated by Haroldo de Campos)  and “Gerald Thomas em Cena : Memória e Invençao” (by Silvia Fernandes).

Schnaiderman will be thoroughly missed.

In a few years, nobody in Brazil will even remember he existed.

Brazil is a country with no memory.

Maybe that’s a good thing.

Maybe that is the worst of all curses.

Gerald Thomas

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Revista Piaíu – “A Parte que me toca” – matéria de Paula Scarpin / Bob Wilson / Garrincha

photo copy

Foto: Crystal Field no meu Quartett aqui em NY, Theater for the New City (1985 – como veem, a Ilka… nenhuma luz lateral nesse bunker, somente o “túnel” de luz vindo de cima. Assinatura minha, saudações, GT

“A parte que me toca” –

Ref: a OTIMA matéria sobre Garrincha de Bob Wilson por Paula Scarpin

Na Revista Piaíu.

Em 2012, o jornal O Globo publicou trechos que teriam sido extraídos do seminário “Gerald Thomas fala e ouve”, realizado no Teatro Poeira, em agosto daquele ano. A certa altura, o diretor brasileiro diz: “Não me faça ir ao teatro assistir algo, pelo amor de Deus. Nem Robert Wilson, ou principalmente esse, porque ele me pergunta o que eu achei e eu falo a verdade. Ele está se plagiando pela milésima vez, nem está ali nos ensaios. Já me interessei muito pelo Robert Wilson, mas hoje eu pago para não ir.” Em entrevista por Skype à piauí, de seu apartamento em Nova York, Thomas desconversou sobre o assunto: “A grande magia do Bob é se repetir. Mozart se repetia, Wagner se repetia. Você acredita no que O Globo diz?”

Gerald Thomas iniciou sua carreira em Nova York nos anos 80, compartilhando referências e colaboradores com Robert Wilson – dentre os quais se destaca Philip Glass, parceiro constante de ambos. Já em sua primeira montagem no Brasil, em 1986 – a peça Quartett, de Heiner Müller, com tradução de Millôr Fernandes

GT – Erro da Paula: meu primeiro espetáculo no Brasil foi “4 Vezes Beckett” no Teatro dos Quatro, Rio, 1985 (com Sérgio Britto, Rubens Correa e Italo Rossi).

Meu segundo espetáculo no BR foi CarmemComFiltro (Fagundes, etc …justamente onde achei Bete Coelho, Luiz Damasceno, etc – e, de onde surgiu a “Cia de Ópera Seca”)

Quartett (que teve sua estreia americana aqui, através de minhas parcas mãos, no Theater for the New City, com George Bartenieff e Crystal Field – 1985….) teve sua estreia com a Tonia e o Sérgio na Sala Laura Alvim em 1986 no Rio.

Mas – o que mais me impressiona: (sorry Paula, ja que se coloca aqui algo sobre o meu passado….) é…NENHUMA referencia a Samuel Beckett que é (ou quem foi) em essência, quem me colocou no mapa, no inicio da minha carreira aqui no La MaMa, em 1984.

 … Thomas recebeu a seguinte crítica de Ilka Marinho Zanotto, do Estado de S. Paulo: “Estão lá, desde as luzes laterais enfrentando violentamente as personagens que se deslocam com extrema lentidão, em linha horizontal, copyright de Bob Wilson.” As comparações sempre foram frequentes.

GT- Se, de fato, a Ilka escreveu isso, só pode ser cega ou burra porque…o cenário era um BUNKER fechado e só havia dois “túneis” de luz que vinham de cima. (ai… ai….)

Anos mais tarde, em 1998, ao dar uma polêmica entrevista para a revista Época, o diretor do Teatro Oficina, José Celso Martinez Corrêa, disse que Wilson era “um grande artista que recebe rios de dinheiro para fazer as pessoas dormirem no teatro”, com a ressalva-provocação: “Apesar de entender a contribuição que ele deu principalmente ao trabalho do Gerald Thomas.” Irritado, Thomas rebateu em um artigo na Folha de S.Paulo que Zé Celso apenas ecoava uma opinião anacrônica da classe média, de que Wilson seria um artista incompreensível. “Adoro o Bob, mas não vejo nada em comum entre o meu teatro, em que os atores suam, e o dele, em que as figuras são completamente estáticas. Não admito uma leitura tão rasa e estereotipante”, escreveu.

Coincidência ou não, dois dos três atores convidados por Wilson para A Dama do Mar e Garrincha têm a trajetória intimamente ligada ao teatro de Gerald Thomas: Bete Coelho e Luiz Damasceno. Quando perguntei a Thomas se conversava com seus antigos colaboradores sobre a atuação deles com Wilson, o diretor se saiu assim: “Não tenho contato com eles. Não tenho contato com a minha avó que morreu em 1980. A Susan Sontag morreu, eu também não tenho contato com ela.” Dias mais tarde, postou um vídeo em sua página no Facebook com o texto: “Até bons atores/atrizes como Bete Coelho precisam de uma boa ‘condução’ como essa que demonstramos nessa passagem de Hamlet (1989), boas épocas de Cia. de Ópera Seca.” O vídeo, gravado com celular a partir de uma tela de computador, tem o título: Gerald Thomas – Hamlet – Bete Coelho sendo “conduzida por mim” 1989.

No final da conversa, Thomas fez uma única comparação de seu trabalho com o de Wilson: “Eu nunca trabalho por commission, sob encomenda. Eu só faço as minhas coisas, eu nunca vou aceitar um tema sem ser por paixão. Eu não trabalho por dinheiro.” Em seguida, ameaçou: “Você está gravando? Porque eu estou. Se você distorcer as minhas palavras, eu te mato. Tenho gente aí na Rocinha, e você acabou.” Ponderou por fim que artistas que ele admira, como o próprio Philip Glass e Pina Bausch, já criaram sob encomenda. Dizendo- se muito deprimido, Thomas falou que, desde que Bausch morreu, arte nenhuma o provoca. Pouco antes de desligar a chamada para seguir para o ensaio, completou: “Sou mais um bobo.”

Luiz Damasceno, um dos atores mais aplaudidos da noite, compartilhava essa visão: “Onde você viu o Brasil? Na música? Nos papagaios?” O veterano, que foi professor de dois dos atores do elenco jovem na Escola de Arte Dramática da USP, disse ter tido um trabalho especial com o texto. “O dramaturgo é americano. Talvez ele use expressões idiomáticas que, quando vertidas, não têm o mesmo sentido pra gente. Eu digo assim: ‘Sua cabeça eu tô vendo que já era! Seu pescoço tem uma boca enorme.’ Eu falo isso porque está lá, mas eu não entendo. O pescoço engoliu a cabeça? Que decepando a cabeça ficou um pescoço com um buraco grande? É quase abstrato.” Um dos fundadores da Ópera Seca, de Gerald Thomas, Damasceno vê muitas semelhanças no trabalho dos dois encenadores, sobretudo no que diz respeito à clareza do movimento corporal. O peso do ator na obra de Wilson, para ele, é muito menor. “Ele é um pintor, e eu me comporto como tinta. Ou um sofá. O texto é só um som que sai da minha boca”, disse.

PS: sim, sou um bobo mesmo  e acho que o Brasil tem mais com que se preocupar ! Um governo em frangalhos, uma Olympiada micada, tudo micado e em frangalhos, etc.

Gerald Thomas

New York – May 16, 2016

 

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The Portrait of an Artist as a Young Man: Gerald Thomas…

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Odio pela política e suas exceções !!!

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Preciso dizer que, apesar do meu ódio pela política em geral, seja onde for, estou emocionadíssimo com esse discurso apaixonado, sem script,etc, do José Eduardo Cardozo que acompanhei daqui de NY pelo UOL. É sempre incrível quando alguém nos lembra como começou tudo isso, com essa merda de Cunha, as manobras, etc. Eu não gosto da Dilma, detesto o PT. Mas isso não vem ao caso. O que detesto mais ainda, nesse momento, são os “manobristas oportunistas” e os filhosdaputa desses politicos ordinários e sem a menor cultura – que sequer sabem conjugar um único VERBO ! Parabéns Cardozo, pela defesa: seja ela por um réu, seja por um criminoso, seja somente ela pela belíssima exposição da liberdade de expressão em si.

Gerald Thomas

NYC

DILMA AFASTADA

 

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METALANGUAGE AND METAPHORS AREN’T JUST WORDS WE HEAR. They are what we LIVE !

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METALANGUAGE AND METAPHORS AREN’T JUST WORDS WE HEAR.

How could it come to this ? how could my mind ever come to this level of a breakdown?

Yanis Varoufakis, certainly is what we could call a Greek philosopher and a pop star, aware of fashion and aware of the world. A hell of a smart guy, after all, there’s hell of a lot of Plato, Sofocles and Diogenes in him. Or maybe I’m just projecting. But then again, who isn’t?

But how and why did I think of him?

Well, maybe because I still think (rather naively, perhaps) that, as long as there are two intelligent people on this planet, capable of sitting down and able to talk (instead of shouting and beating each other up), the world has a lot to gain and gain a lot.

Yes, I woke on this Sunday morning, after another bout with my withdrawal from antidepressants and decided to ignore the Trump infested news. I put on a YouTube video of the twenty best knockout matches ever, won by Mike Tyson.

I love Tyson. And I’m not alone.

After being vilified by the media for being an ignorant, a bully and so on, he did a complete 360 degree turn around and became a witty, self deprecating pop star and stand up comic capable (more than capable) of laughing at himself.

These first impressions of ‘a monster killer’ are hard to break. But they were easily broken on the day when he was visited – whilst in prison – by John F Kennedy Jr. back in the late nineties.

There is a club and it’s called “Notoriety”. There is no entry door but there certainly is an exit door. One day, without prior notice, you’ve expired. But nobody ever tells you. This Exit door is simply shut in your face. Phones are no longer answered or …emails are not replied and you simply wonder if you’re still alive. You look at yourself in the mirror and all you see is a faint image of yourself and it is then, and not before then, that the clock gets stuck at midnight (or at noon – equally frightening).

One becomes a prisoner of one’s own past” I heard someone say about Prince just after his death about two weeks ago. Lord ! Do I identify with that! Do I ? What a weight to carry! Your own baggage. A hell of a weight. And a wait !

And yet….. there are those who can simply ignore all of that, do a U turn and keep on moving swiftly and gently through the small and windy roads of old spiral town, like Parma or Venice or like the streets in a Jorge Luis Borges book.

So, when Yanis Varoufakis spoke, it immediately made me think of pop icons like Tyson and those who are open to dialogue, no matter which dialogue. It made me think of Andy Warhol or Susan Sontag and even, Julian Beck, an actor and philosopher and author / director whom I knew closely since I was the last one and only one to have directed him outside of his Living Theater in a Beckett premiere, “That Time”, as he was close to death.

This is when I discovered what METALANGUAGE, Yes, Metalanguage, the ‘thing” which transformed my theater and put it all into perspective into the here and now and all its tangents. The outer circle and the inner circle all seen from a third perspective.

This occurs when we’re finally able to see our own death and play with it , just as Julian was. After all, we did the play as Julian had been diagnosed with an irreversible full blown cancer at the age I am now, 61. And, coincidentally or not, Beckett’s “That Time” is all about a “person” listening to his voices in the  past in three different eras of his past , A, B and C, dying as he listens. And Julian was on stage, dying as he listened.

It takes guts and humor. It takes that club, Notoriety. It takes a heart wrenching Cartesian perspective that our Greek Finance minister has, Tyson has, Obama has but, all in all, not many other people do.

It takes the understanding of this hard to get concept called METALANGUAGE or METAPHOR that we so often hear people mention but, I bet you a million bucks. Only a very few, really know what it means.

Gerald Thomas

New York –

May 8, 2016

 

 

 

 

 

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Philip Glass and I in a very informal conversation (ages ago) in his kitchen……talking like good old pals….

Live your life as if it was your last day on earth !

Gerald Thomas.

May 7, 2016

New York

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Uma das minhas peças menos vistas (injustamente) e uma das melhores: UM BLOCO DE GELO EM CHAMAS (2006)

METALINGUISTICA PURA, UM CASAMENTO ENTRE O TEATRO E O TEATRO E O MAKING OF DO CINEMA,

GERALD

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Narration in “Gargolios” (with my London Dry Opera Co.) (2012)

No no no. It’s not what you’re thinking. No, this isn’t it. But, in a way, I mean to say that it is, indeed, what you’re thinking. I cannot deny it. Somehow what you’re seeing is this, Somehow what you’re looking at right now confirms exactly that and also confirms that which you’re thinking.

Funny and sad. The collapse. Several amongst us resemble works of art. Several of us have the collapse built into our system. I mean, we might look as we’ve collapsed.

Have we?

Funny, POWER has that face or look of decay as well. Both look as if they have the demeanour of destruction. Really?

So it’s not what you’re thinking. No…I mean,…..yes, it certainly could be that you are thinking this all up. No…

Here it is! Finally: what is…is and what you’re looking at is …what you’re seeing. Therefore what you’re seeing is there, where it is, because, well…. Because I staged it and placed it there. And what is staged and blocked in such manner, must always be questioned., therefore you are definitely seeing and thinking of a sad and funny image.

Gerald Thomas – London – 2012

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Narração inicial de “Kepler, the Dog” (2008)

“Não, não é o que vocês estão pensando.. Não não não. Não é isso. Bom, quer dizer, de de certa forma, de alguma forma é o que vocês estão pensado sim. Não posso negar. De alguma forma, o que vocês estão vendo, é isso. De alguma forma, o que vocês estão vendo confirma isso e confirma isso que vocês estão pensando.

Engraçado…. e triste. O….desmoronamento. Varias obras de arte tem essa cara. Melhor, a cara do que vocês estão vendo agora. O poder, tem essa cara também! O poder da arte tem essa mesma cara.

O que quer dizer isso que eu disse? A arte tem a cara do poder? Isso quer dizer o que… o que? Que o que vocês estão vendo agora é a cara do poder ou da arte? E a arte tem a cara do poder?

Os dois tem a cara da destruição ?

Do autor e diretor Gerald Thomas – em Kepler the Dog (2008)

In English it appears in my play Gargolios with my London Dry Opera Company (2012)

No no no. It’s not what you’re thinking. No, this isn’t it. But, in a way, I mean to say that it is, indeed, what you’re thinking. I cannot deny it. Somehow what you’re seeing is this, Somehow what you’re looking at right now confirms exactly that and also confirms that which you’re thinking.

Funny and sad. The collapse. Several amongst us resemble works of art. Several of us have the collapse built into our system. I mean, we might look as we’ve collapsed.

Have we?

Funny, POWER has that face or look of decay as well. Both look as if they have the demeanour of destruction. Really?

So it’s not what you’re thinking. No…I mean,…..yes, it certainly could be that you are thinking this all up. No…

Here it is! Finally: what is…is and what you’re looking at is …what you’re seeing. Therefore what you’re seeing is there, where it is, because, well…. Because I staged it and placed it there. And what is staged and blocked in such manner, must always be questioned., therefore you are definitely seeing and thinking of a sad and funny image.

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“ARTICULOSE” – trecho de um texto de Gerald Thomas de 1987 (do nada e para nada)

 

GERALD MANEQUIN

 

UMA PAGINA EM 20…

Esperança era sua última esperança, mas mesmo assim baixo demais

Para o ouvido dos mortais

E outras vezes imaginar um outro extremo tão duro de imaginar

Que uma segunda vez se comprimia tanto nesse extremo

Que uma corrente de esperanças e desesperanças se misturavam criando submissão.

s-u-b-m-i-s-s-ã-o, e nada dana em nada.

Tento esclarecer depois.

Imaginando outros murmúrios: pai, pai no céu, pai de deus,

Deus no céu, asa de pai, asa no céu, e outras combinações de cristo com jesus e outros complexos.

Outros nomes completos digamos números, digamos de amados, digamos de amaldiçoados, como a plebe subindo a montanha, ah, mas amados mesmo assim, interjeições inimagináveis, antigos filósofos gregos ejaculados juntos com seus lugares de origem, sugerindo, quando possível, conquista de conhecimento ELE NÃO ESTÁ AQUI, bem audível isso, bem audível. Mesmo assim não totalmente satisfatório, por causa das intermináveis duvidas, como por exemplo, QUAL DIÓGENES?

 

Reconheço a duvida de algumas pessoas quanto a isso ser ou não ser teatro. Reconheço essa duvida histórica sem a qual eu jamais poderia ter ultrapassado tantas etapas, a ponto de dizer: sim, isso é teatro, é mais teatro que qualquer teatro por ser menos teatro de historinha, de mentirinha, de situaçãozinha. Mas reconheço a duvida dessas pessoas, como reconheço a desaprovação dessas pessoas. Não que eu, como autor dessa façanha, dessa “trapaçada”, dessa “embustice” como dizem; não que eu aprove inteiramente. Tenho uns vinte críticos vivendo aqui dentro, aqui dentro da minha cabeça. E o que eles dizem não é melhor nem pior. Vai continuar havendo vida.

 

Posso até me convencer e achar tudo isso muito positivo. Isto é, crescer, se instruir e descobrir pequenas coisas no mundo e adaptá-las ao nosso íntimo, tendo a mais absoluta certeza de que somos únicos, de que importamos pro mundo, de que mais ninguém pensou nessa imagem, nessa coisinha, que ninguém mais incorporou isso. Posso até achar tudo isso muito positivo. Posso até tentar esquecer os vários momentos em que dou de cara com os verdadeiros gênios do passado e os de agora, que não só viram isso, como fizeram disso… uma mera fatalidade do meu passado. O que quero dizer é que posso até tentar esquecer que estamos aqui pra enfatizar algo, ninguém sabendo ao certo que algo, esse algo, pode ser. Alguns tentando de uma maneira descobrir esse algo. Outros tentando de alguma outra maneira descobrir esse algo. Mas estamos aqui só tentando algo. Se alguns tentam algo mais que o algo de formas que não são inteiramente favoráveis, vem logo a fadiga do algo, substituir o algo, mas fazendo algo. Ninguém sabe ainda de qual algo, por que algo, pra qual algo e por quanto algo.

 

Isso ainda ninguém sabe. Então, se alguns tentam fazer algo porque somente outros então se autodenominam os defensores de algo passado e impedem, ou tentam impedir a sequencia logica do algo, que permite acertos, erros e divagações do algo […] ou será que posso dormir tranquilo essa noite, sabendo que alguns sabem realmente de qual algo e pra qual algo e por quanto algo e pra quê? Se alguém sabe, então posso dormir tranquilo. E poderá dormir tranquilo o cerne do universo, com suas forças divisórias, dualistas, dialéticas, antagônicas desse algo. E poderá dormir tranquilo o conflito, a atenção que dizem residir no bom teatro, na boa música. E poderá dormir tranquilo o ocidente ocidental e o ocidente oriental. Não que eu não tente me dizer que escolhi bem ao sair pela tangente, ao ouvir uma suposta voz que me disse ser eu artista, algo assim, artista. Não me disse ser artista da musica. Não me disse ser artista do campo. Me disse só isso. Me disse também ser de uma certa clareza. Só isso. Não me disse ela ser uma clareza de ideias, ou de uma clareza de noite. Não que eu não tenha prestado atenção nessa clareza. Não que eu não tenha prestado alguma atenção a essa maldita clareza que me faz ver com ainda mais clareza que eu ainda não posso dormir tranquilo, e que ninguém ainda sabe algo, e nem chegou perto de algo. Que o resto são mesquinharias, meros passatempos, meros bordados. Das mais simples tapeçarias às teses mais complicadas. Bordados. Alguns padrões interessantes, alguns motivos não totalmente sem criatividade, mas bordados mesmo assim. E onde está a gargalhada? A gargalhada, hein? Onde está a gargalhada de um Shakespeare, por exemplo, ou de um Aristóteles, por exemplo, ou de um Joyce?

 

Não que eu não dê minhas gargalhadas. Não que eu não morra de rir às vezes quando não consigo dormir tranquilo. Não que eu não morra quando passo perto de um hidrante, por exemplo, ou passe diariamente no Bowery com a rua 3, que é onde fica um abrigo de velhos, pobres, bêbados, drogados, loucos. Não que meu riso não vire lagrimas. Não que eu não berre de alguma forma mais inibida quando eu fixo meus olhos no olhar vazio de um louco no Men’s Shelter. Não que isso não produza peças, produza textos, bíblias, mandamentos, verdades e mentiras. Não que tudo isso não produza algo. Pra mim e praqueles que dizem saber do algo e de suas estruturas.

 

Tento então por outros caminhos. Tento então admirar alguns fenômenos. Isso, alguns fenômenos. Assim, talvez, tudo isso passe mais rápido. Tento admirar o fenômeno do aprendizado por exemplo. Ou instruir os outros, que fenômeno! Não que eu não tenha minhas reservas. Não que eu não tenha minhas reservas em passar adiante, alguma coisa captada”. Não que eu não tenha profundas reservas em garantir o sucesso da história. Ou mesmo garantir a sequencia da história, hein? Na medida em que a veracidade é a mesma veracidade daquela que existe quando uma história é contada de pessoa pra pessoa pra pessoa. A decima primeira pessoa provoca o nó da história. O nó da história, e esse é o algo da nossa lógica. Não que eu não tenha reservas sobre isso. Não que eu não admire esse “processo”. Não que eu não tente passar adiante esses “conhecimentos eruditos” adquiridos impunemente em algum lugar e de onde já foram retranscritos inúmeras vezes de pessoa para pessoa. A décima-primeira transcrição provoca o nó da história. O nó da história. Não que eu não admire tudo isso. Reconheço, por exemplo, de nos mantermos “ocupados”. Reconheço o valor em estarmos ocupados, fazendo ou mesmo “almejando” coisas. Reconheço a importância de estarmos ocupados pra merecermos os momentos quando não estamos mais ocupados. Sei como é importante tudo isso. Sei como é importante terminar o dia tendo almejado alguma coisa. Sei como é importante terminar o dia tendo mesmo conseguido alguma coisa. Sei também que é importante deixar algo para ser almejado no dia seguinte, por exemplo. Reconheço o valor do descanso no fim de tanto almejo e tanto alcance.

 

Sei como o almejar tem sido importante desde os modernistas. Sei por exemplo da importância dos modernistas. De como eles mudaram substancialmente as nossas vidas. De como eles mudaram qualitativamente a nossa vida. Reconheço o valor dessa coisa chamada perspectiva. Reconheço o valor nisso. Reconheço a perspectiva de me enxergar como um completo idiota. Um completo idiota. Caminhando pelo mundo e pelas tangentes adaptando observações ao meu íntimo. Perfeito idiota. Reconheço a minha perfeita idiotice em acreditar, no fundo do fundo, existir realmente algum progresso. Perfeito idiota em achar que existe progresso no próprio frio, no mero fato de fazer frio. Perfeito idiota. Tenho perfeita noção de quanto progresso eu fiz, numa fase da minha vida quando fiquei obcecado por um fichário negro que vi numa vitrine a rua 8. Eu sabia que não conseguiria escrever uma só linha ou nenhuma fase completa se eu não possuísse aquele fichário. Me lembro também de umas canetas que ”almejava”. Sabia que sem essas canetas eu não conseguiria organizar o caos da minha vida. Um dia fui comprar um fichário e as canetas no dia mais rigoroso do inverno. A Mercer Street, onde eu morava, com quase um metro de neve, e poucas lojas abertas. Organizei toda minha vida com esse fichário. Portanto reconheço a importância de se fazer esses progressos. Mesmo eu u tenha perdido qualquer escrito que tenha originado desse fichário, reconheço a sua importância. Mesmo que os escritos não servissem pra nada, reconheço a importância desse fichário. Mesmo que ele tenha desaparecido, junto com toda época da minha vida, reconheço que algum progresso foi feito. Reconheço ser um perfeito idiota quando acho que devo anotar a cada minuto e cada preciosidade da minha vida. Reconheço tudo isso.

 

Não que eu não me vanglorie em saber pensar em inglês e em português ao mesmo tempo. Não que eu não me vanglorie até saber pensar em alemão ao mesmo tempo. Não que eu não me vanglorie em saber tudo profundamente sobre a pobreza de uma língua e a riqueza de outra. Como, por exemplo, a simples palavra vida. Seu similar em inglês, lifetime, tão mais completo. Tao mais completo lifetime, ou seja, vida tempo. Pois é exatamente assim. Pois é exatamente assim que percebemos o passar da vida. Ou pelo menos é o instrumento que usamos pra medir o passado da vida. Ou pelo menos um é a perspectiva do outro quando queremos um pouco mais de um, um pouco mais do outro. Não que eu não me vanglorie em poder usa-lo como metáfora, por exemplo. Não que eu me vanglorie em poder usa-lo na medida, já que eu não trabalho numa fabrica, já que eu não sou subordinado a um tempo dos outros, ou a de um senhor mesquinho, ou de um sistema mesquinho, que usa a minha vida pra medir o seu tempo. Reconheço como sou feliz por não fazer parte disso. Reconheço que sou feliz por notar que nem tempo nem vida fazem sons horrorosos na minha barriga.

 

Não que eu não ache certas invenções lindas, por exemplo. Não que eu não ache lindo, como ser humano que sou, os achados da ciência, da tecnologia, do progresso, da matemática e da física. Não que eu não ache irônico que o progresso nos leve à nossa extinção. Apesar de que isso não me deixa triste. Me deixa até um pouco encorajado. Reconheço a importância das nossas invenções na medida em que elas representam nosso contato um degrau a mais com, digamos, deus, digamos, com esse imenso enigma. Mas o que me deixa triste é que esses achados se tornam perdidos na própria vida daqueles que o acham. Não que eu não me encante com as teorias, por exemplo, me encanto. Me encanto com a teoria do barbante, da string theory, que ora reside em Princeton, e que voltou à base das coisas thing, tudo de coisa, por falta de uma substancia melhor, ou por economia de pensamento, bem como Getrude Stein fazia com literatura no inicio do século. Só que a criticavam como criticam a teoria do barbante. Reconheço até a beleza entre literatura e ciência. E finalmente reconheço até nessa beleza hipnotizante de que tudo um todo e todos, checando até a possibilidade de deus ser um concretista, no sentido mínimo e máximo desse enigma, que eu reconheço ser ate muito bonito mesmo, assustadoramente até, incalculável e sem resposta, e por que não dizer, sem cura.

 

Essa “strong thing”, como Princeton chama, é sem dúvida fascinante, principalmente o aspecto “thing” da coisa, o aspecto “coisa” da coisa; pra não mencionar o aspecto “forte” da coisa, o que me leva a pensar que podemos estar falando de monstros japoneses, ou de filmes de horror, ou de uma partícula que funciona em dez dimensões, o que é o caso, dez dimensões, e que une tudo. Isso é a strong thing que vem de New Jersey, pra quem não sabe, o além-mar de Nova York, o que representa o fascínio e a rejeição que todo além-mar representa. Não que não me fascine entender tudo isso. Não que não me fascine ler que dez dimensões é a teoria de agora e portanto não posso deixar de me entristecer quando percebo que no fim da vida, se eu sobreviver até lá, no fim da minha vida vou ler no mesmo jornal que agora são 78 dimensões e o que vem de Princeton é a “weak rope” ou o que valha. Não que eu não veja a ironia em tudo isso. Não que eu não reconheça a ironia de jogar com tudo isso, de especular com tudo isso de uma forma superior, como só os artistas conseguem, nesse momento de irreverencia e desrespeito. Não que eu não seja capaz de reconhecer a minha condição de irreverencia e desrespeito. E me arrisco até a dizer que me alegra um pouco essa irreverencia e desrespeito, mas por pouco, até perceber que alguém mais inteligente do que eu possa estar lendo esse ensaio e ter outras” ideias a meu respeito, ideias ainda mais angulares a meu respeito, ou de achar a meu respeito uma certa insignificância no que ele estaria realmente errado. Ou de saber muito mais sobre as minhas sabedorias e dizer por exemplo que me estilo de pensamento lembra George Duhuit, ou que meu estilo de literatura lembra Beckett ou Stein, e que esse alguém, com o ar apreensivo, e fecha então esse capitulo da sua história achando a sua própria inteligência muito mais inteligente que a minha, o seu estilo melhor do que o meu, suas apreensões mais interessantes que as minhas. Esse alguém, obviamente, só poderá ser eu mesmo no dia em que eu ler esse artigo impresso na Folha de S. Paulo, ou escutá-lo em alguma peça de teatro criada por mim mesmo com o único sentido de me superar. Não que eu não me vanglorie em entender a minha lifetime, ou a perspectiva da minha lifetime.

 

Não que eu não reconheça como é bom se ver na perspectiva. Reconheço. Reconheço até que deve servir para algum fim, algum proposito, algum bem-estar. E se é que existe algum proposito ou bem-estar, ele deve estar equacionado com a dificuldade profunda de se imaginar um bem-estar não se estando bem. Não que eu não reconheça a ironia do concretismo, como já disse antes, reconheço. O concretismo em si é profundamente irônico porque o chamamos assim, de concretismo. Chamamos tudo que temos de não concreto, tudo que temos de metafisico e metafórico e abstrato de concretismo e só porque dependemos da palavra e dos conceitos, isso em si só me deixa transbordado de depressão. Meu deus, não que eu não reconheça a virtude em dissecar qualquer ato e intenção em sílabas, não. Não que eu não reconheça a ironia da string theory sem ser trocadilhos um ato concretista.

 

Não que eu não reconheça o valor em não termos mais um mito. Não que eu não reconheça o valor em termos progredido para o pragmatismo básico que chama tudo de “coisa”, e se não chama ainda, vai chamar. Reconheço o grande passo dado em tirar, arrancar, a nossa existência de uma dimensão determinada e joga-la, violentá-la, contra outras. Reconheço a imensa virtude em aprender tudo isso, em perceber tudo isso como percebo e imagino, como imagino, que tudo pode ser mais um erro de conceito, uma outra língua pra fora, uma percepção cabeluda. Pode ser tudo mais um Harvard boy brincando com a gente, fazendo “arte” como eu faço; pode ser tudo artimanha de um físico exaurido, sem mais inspiração que chama tudo de “thing”. Ou pode ser um estrangeiro que num momento da conferência, no momento da pergunta vital falou “coisa” e isso então vira a modalidade para até, digamos, 95, 96, quando surgirá, fatalmente, a anti-thing. Reconheço a virtude de tudo isso.

Gerald Thomas

New York, October 1987

Papo livre com Haroldo de campos (1999)

 

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Jardel's GT ebook

Comments Off on Scholar Jardel Dias Cavalcanti has just concluded a fantastic study on my work – it’s available on e-book on Amazon:

May 4, 2016 · 6:52 pm

EletraComCreta – uma breve cena de Maria Alice Vergueiro, MAM – Rio, 1986.

 

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Maria Alice, sendo enforcada pelo ator Marcos Barreto, diz, berra, num único folego, sem folego:

“Esperança era sua última esperança, mas mesmo assim baixo demais para o ouvido dos mortais

E outras vezes imaginar um outro extremo tão duro de imaginar

Que uma segunda vez se comprimia tanto nesse extremo

Que uma corrente de esperanças e desesperanças se misturavam criando submissão.

S-u-b-m-i-s-s-ã-o, e nada dana em nada.

Tento esclarecer depois.

Imaginando outros murmúrios: Pai, Pai no céu, Pai de Deus, Deus no céu, Asa de pai, Asa no céu, e outras combinações de Cristo com Jesus e outros complexos.

Outros nomes completos digamos números, digamos de amados, digamos de amaldiçoados, como a plebe subindo a montanha, ah, mas amados mesmo assim, interjeições inimagináveis, antigos filósofos gregos ejaculados juntos com seus lugares de origem, sugerindo, quando possível, conquista de conhecimento ELE NÃO ESTÁ AQUI, bem audível isso, bem audível. Mesmo assim não totalmente satisfatório, por causa das intermináveis duvidas, como por exemplo,

QUAL DIÓGENES????

(Maria Alice cai dura no chão)

EletraComCreta, de Gerald Thomas

estréia no Museu de Arte Moderna, Rio em 1986

No elenco, a Cia de Opera Seca: Bete Coelho, Vera Holtz, Maria Alice Vergueiro, Beth Goulart, Luiz Damasceno, Domingos Varela, Marcos Barreto, Magali Biff, Wagner Pinto (cenário; Daniela Thomas)

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