O IMPÉRIO DAS MEIAS VERDADES
New York – Brecht, o Bertold, assim como Chaplin, foram perseguidos pelo macartismo. Foram investigados por Hoover e foram blacklisted e perseguidos pela bruxaria. Também milhares de escritores, cineastas, atores acabaram nos fornos da perseguição! Muitos colaboraram, como sempre colaboram, e entregaram os outros para se SAFAR. No espetáculo (bem autobiográfico) “Rainha Mentira” eu contava episódios sobre a minha própria família: odisséias nada simpáticas através do Terceiro Reich, que Ruy Castro e a Cia. Das Letras resolveram distorcer de tal forma num livro horrendo, que acabou por causar, indiretamente, a morte da minha mãe, poucos anos após o lançamento dele.
50 ANOS DE ILUSTRADA. PÓS-TUDO
(50 anos de cultura)
Recebi aqui o livro e estou até agora meio bestificado. Quero dizer, bestificado de uma forma boa. Muito boa.
A seleção feita por Marcos Augusto Gonçalves nos seis meses em que teve para cavar nos calabouços dos arquivos de 50 anos de cultura do caderno, resultaram num livro incrível e… Não posso deixar de REGISTRAR aqui a minha enorme gratidão pelo destaque dado ao meu trabalho e a essa figura que lhes escreve.
Entre outras várias entradas e fotos, na página 236, por exemplo, fico lisonjeado em aparecer numa entrevista que o Otavio Frias Filho fez comigo em 1988 (caramba! O tempo!). Transcrevo um trechinho:
“Gerald Thomas e a Impossibilidade de Dizer”
…Arte é uma coisa menor. A ciência, hoje em dia, é muito mais artística do que a Arte, só que não é entretenimento. A Cibernética, a Matemática que se estuda de dez anos para cá é uma coisa muito mais artística. Ela é hoje o que o teatro foi para os gregos. Está para nossa civilização como Freud esteve cento e poucos anos atrás. Pela primeira vez a Física está usando termos místicos, falando de “a coisa”. Eles não têm coragem de falar em deus ainda, mas daqui a pouco vão admitir um deus, não por forças místicas, mas porque as equações derramam nisso aí. A Arte hoje em dia é uma arte de declamação e falha, inclusive, nisso, porque é adornada, decorada com artificiozinhos. Pegue qualquer pintura: ela não é a síntese da nossa existência resolvida nem a problemática da nossa existência por resolver.”
(Janeiro de 1988)
Tem mais, mas só transcrevo isso, porque já está ótimo. O livro é uma homenagem à cultura, a brasileira, se é que existe isso. Existe. A Santíssima Trindade do Teatro, como Nelson de Sá assim a batizou, está lá: Zé Celso, Antunes e eu. Eu e Bete. Bete e eu, o eterno casal. O casal que nunca se vê. Já não vejo a Bete há (desde que o Muro de Berlim foi erguido em 1961… ooops!)
De resto, estou sem tempo para me estender numa grande coluna porquê, numa troca de e-mails ontem com o Vamp, questionamos o quanto vale o Blog, o quanto ocupa o nosso tempo ficar analisando o chat dos comentaristas entre si próprios. Ao mesmo tempo, o blog é para isso mesmo. As contradições e suas sombras, os nicknames e as pessoas iradas que parecem tudo saber, nada saber, curta memória e aqueles que curtem a memória.
Jurei que não escreveria nada hoje, Domingo, dia de chuva em NY e encontros com gente do passado, e com uma papelada enorme aqui diante do computer. O quê? Como? Sim! Uma compilação de COLUNAS e artigos e mais colunas e peças escritas e livros de compilações de tudo e pós-tudo.
Aqui, um trechinho de uma coluna que escrevi para as contra-capas do “Caderno B”, do JB, das terças (esta de 15 de abril de 2003, o ano em que voltei a morar em Londres):
“…Quem lucra? Quem perde? É complicado. Uma nova ordem econômica mundial está se formando. Evidente que os americanos já estão com total controle sobre o petróleo iraquiano. Ao mesmo tempo, o Congresso Americano não debate mais as questões que estavam massacrando há seis meses (Enron, WorldCom, Inclone, AOL-Time Warner e outros escândalos corporativos). Os ingleses, que nunca aderiram ao EURO, se juntaram com os americanos e, ao que me parece, o alvo é continuar a procurar inimigo do “eixo diabólico”… Já que a Al Qaeda está aí e tudo que aconteceu foi o seguinte: já que não conseguiram, até hoje, encontrar o Bin Laden, foram atrás do Saddam Hussein.”
Quem diria, quem diria… relendo isso 5 anos e meio depois não dá um CERTO CALAFRIO????
Caramba! Já escrevi em tantos jornais e de tantos cantos do mundo, desde Zagreb, Budapest, Miami, Tel-A-Viv, Tucson (Arizona), Munique, Chapada da Diamantina, até sei lá onde. Me pego lendo colunas como “Sir Fernanda Montenegro” ou “Um ano sem Paulo Autran” ou “Doutor Sergio Britto”, o homem de teatro que me levou ao Brasil e a quem sou e serei eternamente GRATO – porque sei ser GRATO, SIM – sempre e que me deu “Quatro Vezes Beckett” de presente em seu “Teatro dos Quatro”.
Era uma versão de “Beckett Trilogy” daqui, aquela com o Julian Beck no palco. Sérgio me levou pro Rio uma, duas vezes. A segunda foi pra fazer o “Quartett”, de Heiner Mueller, com ele e Tonia Carreiro. Ambas as montagens nos renderam prêmios Moliere.
Numa conversa com meu amigo Caetano Vilela, ele me dizia que o teatro não se prestigia mais; não existem mais prêmios e que os prêmios de hoje surgem de pequenas panelinhas. Eu ouvi, pensei e pensei de novo.
Tudo já foi mais glorioso. Deixei meu prêmio Moliere cair no chão de propósito e recusei a passagem em econômica da Air France porque… porque eu ia daqui de NY para Paris anyway, então para que ir do Brasil, apertado, sendo que aqueles QUINHENTOS MIL dólares de mídia que NÓS rendíamos a eles, por causa daquele evento (sendo os 6 melhores do país) não podia, ao menos, nos render assentos em classe executiva? (Um ano depois de meu protesto, parece que virou executiva, sim)
Este livro me traz muitas memórias. O Brasil precisa delas. Um país que quer apagá-las, como o Incêndio do Teatro Cultura Artística, o fogo mais metafórico da história.
Obrigado, galera, por terem deixado ser quem eu sou!
Somando e dividindo tudo, só tenho mesmo a dizer:
OBRIGADO, estou super de BEM com a vida!
Gerald Thomas
(O Vampiro de Curitiba na edição)