UMA DIFÍCIL CHEGADA
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São Paulo – Eu achei tão pertinente o artigo da semana passada do Eliakim aqui no DR ("A mesmice do carnaval na TV") que me senti vingado. Ou seja, o Carnaval da Sapucaí que tanto já me entusiasmou, já me levou aos prantos e tirou sangue das minhas mãos (que dramático, não?) quando eu saía na bateria, se transformou num bando de gente pulando. Um bando de gente qualquer nota pulando, gente que nem sambar sabe.
O Carnaval mais ou menos acaba refletindo isso, o que todas as festas nesse nosso mundo febril e seco (o Oscar hoje por exemplo) estão virando: um pastiche, um pastel murcho, um bando de mesmices chatas onde o previsível chega a ser um elogio! Gente se exibindo, posando pra fotógrafo, fotógrafo pago por essa mesma gente para estar lá e ser fotografada em seus melhores momentos. E, em seus piores momentos, os paparazzi pagos pelas redações amarelas ou marrons, pegando elas (ou eles) – ilustres – nos seus momentos de decadência, os seus momentos "morgue" ou aqueles que eu chamo de pré-Instituto Médico Legal (ou ilegal, conforme o caso).
Chegar no Brasil…..Deus, como é difícil aclimatar-se! Como fica difícil a conversa. O Brasil se basta. Os horrores daqui levam a patente daqui. E as pessoas chegam a ter ciúme dessa patente. Os horrores do mundo, bem….isso parece não interessar muito a ninguém. Acusar sim. Adoram acusar. Não sabem muito sobre nada, mas fingem que sabem e acusam. É como se vivessem lá, digo, no primeiro mundo: e discursam. O quintal do vizinho, cheio de roupa suja brasileira. Vontade de ficar no quarto de hotel sozinho e calado! Bico calado!!!!
Não há mais como conversar. Digo, manter uma conversa viva. Os assuntos hoje requerem o QI mais baixo possivel, gracas às revistas imbecilizantes e aos programas de televisão. Isso fica ainda mais nítido aqui no Brasil. O choque da chegada, depois de cinco meses de ausência, é tão grande que quase não tenho palavras para descrevê-lo.
Mas entre as colunas sociais (e as boçais), a cultura e a política se resolvem num império de meias verdades, ou das mentiras completas. Quando sento num bar junto com os atores e ouço as conversas que rolam nas mesas do lado, não sei se choro ou me belisco para ver se é mesmo nesse mundo que estou ou se estão pregando uma peça de Augusto Boal em mim: o teatro do oprimido brincando em torno de mim para acusar aquilo que a sociedade tem de mais horrenda.
Sem maquilagem, sem disfarces, a paulicéia com suas peruas, seus carrões, sua miséria, seus mendigos atirados entre os faróis de trânsito, querendo me dizer que pulando e pulando e falando idiotices aos celulares esse mundo continua.
Não aprofunde nada não, porque se chegarmos perto do cerne de alguma questão, talvez a descoberta seja ainda pior. Talvez a descoberta seja a de que os nossos corações irão parar de bater por completo, assim como naquele conto de Kafka, quando descobrirmos o quanto somos rasos de verdade.
Gerald Thomas
do diretodaredacao.com