COMO A HISTÓRIA SE REPETE
Rio – Estou no Rio palestrando sobre Samuel Beckett num festival que comemora seus 100 anos. Vejo que o meu amigo/autor era realmente um visionário quando colocava no palco cenários devastados, desertos com uma única árvore e seres perdidos, como em "The Lost Ones": "Abode where lost bodies roam each looking and searching for their lost ones……"
Beirute hoje, 2006. Desde minha saída de Nova Iorque, onde a temperatura beirava os 100 graus (farenheit), na quarta passada, eu tentava desesperadamente localizar o genial médico, Dr. Riad Younes, diretor do hostipal paulistano Sírio Libanês. Riad havia me dito em junho que passaria as férias com a mulher Nadia e as filhas em Beirute. E desde que começou essa loucura toda não fiz outra coisa senão tentar localizá-lo, sem sucesso. Cheguei a ponto de ligar para o Departamento de Estado norte-americano, explicando quem ele era, que tinha feito um estágio memorável no Sloan Kettering Memorial Hospital, para ver se isso o tornava visível para os comboios de Marines que trabalham na evacuação de pessoas das terras libanesas. Mas nada: somente cidadãos norte americanos. Até que na sexta, me ocorreu que valia a pena ligar para seu consultório em SP mais uma vez. Uma pessoa me passou para outra e acabei sem o nó na garganta: Riad estava são e salvo em Aman, na Jordânia, já com vôo marcado para Paris e que estaria no Brasil esta semana.
Mas milhares de pessoas não estão tendo a sorte que eu tive, se é que se pode chamar o triste destino de qualquer família neste momento em Beirute de sorte.
Claro que a provocação do Hesbollah despejando seus mísseis sofisticados em território israelense merece resposta. Mas há alguma coisa horrenda nisso tudo: a questão ética do estado de Israel. Se eles acham que vão desmontar o Hesbollah acabando com a população civil libanesa e criando uma imagem de imbatíveis (estilo Bush) para o mundo, eles estão fazendo justamente com que os extremistas islâmicos se unam mais ainda. E o mais grave é que o Hesbollah ganha ainda a simpatia da população árabe em geral.
Sim, porque entramos na era dos paradoxos totais, paradoxos nucleares: um grupo terrorista tem o direito de ser um grupo terrorista. Pode burlar todas as regras, esconder-se atrás de hospitais, usar crianças como escudos, enfim, fazer de tudo para aterrorizar e criar pressão política através do medo e do sangue derramado. Mas um Estado, um governo, não tem o direito de agir inescrupulosamente, assim como as ditaduras militares que não respondiam a ninguém. Por mais que Israel queira ou precise mostrar sua força e seu poder de sua defesa, ele precisa acima de tudo do mais sofisticado sistema de intelligence que os informe com precisão onde estão os bunkers terroristas, antes de soltar bombas por toda Beirute, na população civil, matando famílias que nada têm a ver com isso e criando o caos num pais ainda em processo de reconstrução. Se quiserem contra-argumentar que uma minúscula facção do Líbano protege o Hesbollah, isso faz sentido: então que Israel bata na porta certa.
Agindo dessa maneira, Israel se coloca no mesmo nível que os terroristas. E isso é lamentável. Parece não haver nenhuma trégua num futuro próximo, nem com a Condoleeza a caminho, nem com dezenas de estrangeiros "peace mediators" metendo o bedelho como sempre. O Iran e a Siria estão profundamente ligados a esse conflito e o que estamos vendo, possivelmente é o inicio da terceira guerra mundial. Porque agora Bush e Blair, França (por aliança histórica), serão dragados para dentro dessa zona. E homens-bomba explodirão nas capitais do mundo como represália. E por que? Porque capturaram 2 soldados Israelenses? Porque o Hesbollah soltou alguns mísseis que foram parar na água e em Haifa? Será que o Serviço de Inteligência de Israel não se sofisticou nesses anos todos contra o seu pior inimigo a ponto de conseguir achá-lo num momento critico?
No final disso, estaremos todos com a aparência de criaturas Beckettianas, precisamente como no cenário devastado, roupas rasgadas e sujas, clowns homeless sobreviventes à espera de alguma coisa inexistente que jamais virá: Godot. Esse mesmo, sobre o qual o mestre Beckett escreveu 10 anos após o holocausto.
Como a Historia se repete!
publicado por Ana Peluso, à revelia de Gerald Thomas
Do Direto da Redação:http://www.intellibusiness.com.br/diretodaredacao/index.php